Começou a Guerra Santa

Vários candidatos pedem ajuda aos céus. Mas vale lembrar a frase de Saldanha: “Se macumba ganhasse jogo, o Campeonato Baiano terminaria empatado”

A campanha oficial começou e tudo indica que a religião vai mesmo ocupar grande espaço nessa eleição. Entre os cristãos, o clima é de novo e profundo cisma. Segundo a mais recente pesquisa do IPEC (ex-Ibope), Lula tem a preferência de 51% dos eleitores católicos contra apenas 26% de Bolsonaro. Entre os evangélicos, o quadro se inverte: Bolsonaro surge à frente com 47% e Lula tem 29%.

Não chega a ser novidade. Católicos e evangélicos estão em posição diferente nas pesquisas de opinião há algum tempo. Enquanto o discurso anticonsumista do carismático papa Francisco aproxima-se do ideário socialista do PT, o ultraconservadorismo de algumas correntes evangélicas tem tudo a ver com a visão retrógrada e misógina do ex-capitão que ocupa o Palácio do Planalto. E com o fanatismo da primeira-dama Michelle Bolsonaro,

A Igreja Católica não assume abertamente a oposição a Bolsonaro ou o apoio ao ex-presidente Lula. Mas, ao pregar um pacto pela vida, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) obviamente se afasta da visão desumana e doentia do atual presidente. Em direção oposta, pastores da Igreja Universal e da Assembléia de Deus inflamam seu rebanho contra o PT. Marco Feliciano, por exemplo, anda dizendo que as igrejas evangélicas serão fechadas pela esquerda. E também afirma que a Receita Federal, num governo Lula, vai perseguir os templos evangélicos.

Principal alvo da guerra santa, Lula tratou de mandar um recado ao evangélicos logo no primeiro dia de campanha. Em discurso na porta da Volkswagen, em São Bernardo do Campo, disse que Jair Bolsonaro está mentindo: “Se tem alguém que é possuído pelo demônio, é esse Bolsonaro”.  E completou: “Ele, na verdade, é um fariseu, está tentando manipular a boa fé de homens e mulheres evangélicos”. Já o Capitão Coveiro, nas redes sociais, insistiu em suas mentiras ao advertir que “os que perseguiram e defenderam fechar igrejas se julgarão grandes cristãos”.

Um cristão que segue o Evangelho ao pé da letra poderia argumentar que os políticos estão errados ao envolver Jesus Cristo com questões terrenas. Afinal, ao ser perguntado sobre a obrigação de pagar impostos, Cristo ensinou: “Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”. É verdade. Mas também vale citar outra mensagem do Filho do Homem: “Não pensem que eu vim trazer paz ao mundo. Não vim trazer a paz, mas a espada”. E, avisado de que Maria e seus irmãos o aguardavam, Ele exclamou que “quem faz a vontade de meu Pai que está nos céus, este é meu irmão, minha irmã e minha mãe”.

O embate religioso, pelo visto, vai longe, com católicos de um lado e evangélicos de outro. No Rio de Janeiro, pelo sim, pelo não, os três principais candidatos ao governo do Estado foram à missa no primeiro dia de campanha. Cláudio Castro, candidato à reeleição, ficou 10 minutos na Paróquia São José, na Lagoa. Nome forte da esquerda, Marcelo Freixo, do PSB, subiu os 382 degraus da Igreja da Penha e apareceu de mãos postas diante do altar. O pedetista Rodrigo Neves rezou no Santuário das Almas, em Icaraí, do outro lado da Baía de Guanabara.

Castro, Freixo e Neves se deixaram fotografar contritos,  pedindo a proteção divina. “Andá com fé eu vou/que a fé não costuma faiá.” Certamente eles se inspiraram no canto do grande Gilberto Gil. Pode ser que a fé não falhe. Mas é bom que candidatos às eleições de outubro, cristãos ou não, também tenham em mente uma frase definitiva de João Saldanha: “Se macumba ganhasse jogo, o Campeonato Baiano terminaria empatado”.

PS: Eu sou católico e estou com Lula.

Octavio Costa

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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