Debate, ringue ou picadeiro?

Há regras demais e concorrentes em excesso

A temporada de debates com os candidatos a presidente mal começou e já produziu um dos momentos mais infames da história das campanhas eleitorais no Brasil. Inadmissível a brutalidade com que Bolsonaro reagiu a uma pergunta da jornalista Vera Magalhães sobre vacinas.

Como esse é um dos flancos de maior vulnerabilidade do candidato, ele se descontrolou e mostrou quem verdadeiramente é: um depredador da imprensa, da democracia e dos direitos das mulheres, além de mentiroso serial.

Diante da violência verbal do presidente (também contra a senadora Simone Tebet, do MDB), foi perturbadora a falta de reação do pool de empresas jornalísticas, anfitriãs do encontro televisivo. Bolsonaro deveria ter sido repreendido imediatamente. Mas o roteiro seguiu inalterado, a não ser pela solidariedade à jornalista por parte de alguns candidatos.

Ataques contra jornalistas não podem ser naturalizados. Este foi em rede nacional, ao vivo e a cores, com milhões de brasileiros assistindo. Bolsonaro será convidado para os próximos debates sob o risco de repetir sua verborragia de espelunca e exibir sua personalidade primitiva? Não importa o quanto minta e agrida?

Desde que surgiram, nos EUA, nos anos 1960, debates na TV ganharam a fama de serem decisivos em eleições. É assunto bastante controverso, sobretudo na era digital. No Brasil, tem sido muito difícil definir um formato que traga contribuição substantiva ao eleitor, até porque os próprios candidatos se comportam mal, como no debate da Band.

Ignoraram temas propostos pelos jornalistas e fizeram perguntas aos adversários sem o menor interesse em saber o que pensam. Queriam apenas despejar frases feitas e promessas, muitas delas irrealizáveis, para editar e postar em rede social. Há regras demais e concorrentes em excesso. O conteúdo se perde. Sobram os escorregões, como no caso da fúria de Bolsonaro. O que estamos, como mídia, oferecendo ao eleitor: debate, ringue ou picadeiro?

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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