Introvertidos Anônimos

A AIA – Associação dos Introvertidos Anônimos — abriu às nove horas da manhã para a sessão inaugural. Entrou o primeiro introvertido anônimo e sentou bem no fundo da sala. Cabeça baixa, mínimos movimentos. Entrou outro e sentou mais distante possível do que já estava lá. Quieto, recolhido em si. Entrou uma introvertida anônima e procurou outro lugar equidistante dos dois primeiros. Muda, estátua. E, assim, sucessivamente, a sala foi se enchendo. Os últimos tiveram que se contentar com os piores lugares, ou seja, ao lado de outros introvertidos anônimos. Um silêncio pesado reinava entre os participantes da sessão inaugural. Não se ouvia um arranhado de limpeza de garganta. Nada. Uma mosca que voasse ali pareceria fazer o barulho de um helicóptero — mas nem mosca voava ali.

Às nove e meia entrou o mediador da sessão. Entrou, sentou à mesa, limpou a garganta e tentou ser amistoso desejando, em voz alta, um bom-dia para todos. Nenhuma resposta. Ele sorriu e abriu o livro que havia trazido. Bem, disse ele, vou ler para vocês um relato sobre motivação e convivência feito por um monge budista do século XIII. Leu com entusiasmo, mas a platéia não reagiu. Ele pareceu aprovar com leve sorriso. Ao fim da leitura, ele disse: — Alguém tem alguma observação sobre o texto, alguma crítica ou sugestão? Silêncio total, cabeças baixas, mãos fechadas e pernas enfiadas debaixo das cadeiras. Ele novamente sorriu. Pôs um vídeo de dez minutos sobre relações humanas e nenhuma reação. Mais um sorriso.

No final da sessão, sem que nada de normal — um suspiro que fosse — acontecesse, ele desejou um bom-dia a todos e preparou a retirada. Os participantes nem se mexeram nas cadeiras. Ele então disse que a sessão estava encerrada e que todos podiam se retirar. E saiu para o corredor. Depois de cinco minutos, saiu o introvertido anônimo que havia entrado por último na sala. O mediador ficou preocupado e pensou: “Esse vai dar mais trabalho, pois precisa — primeiro — aprender a conviver melhor com outros introvertidos anônimos.

*Rui Werneck de Capistrano pertence a DEA – Desassociação dos Escritores Anônimos – e escreve pra burro (não é você, calma!)

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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