Diário da crise CCCXIV

Não escrevi ontem sobre a história do leite condensado e do chicletes porque a notícia me alcançou já no principio da noite e o texto do diário estava pronto. Naturalmente, é espantoso gastar R$15 milhões com leite condensado e R$2 milhões com chicletes.

Depois desta notícia aparecer, o portal da Transparência saiu do ar. O governo tem informado que tanto o leite condensado como o chicletes foram comprados para as Forças Armadas. Há uma grande discussão ainda em torno do preço das latas. Tudo isso precisa ser esclarecido com gente especializada do Tribunal de Contas.

Ouvi pela tevê que o chicletes é para soldados que entram na mata onde não há água para escovar os dentes. E para os pilotos por causa da pressão nos ouvidos, quando decolam ou pousam. Tenho algumas dúvidas sobre tudo isso. Nas companhias aéreas os pilotos compram seu chicletes.

E não acho que existam tantos soldados no meio do mato no momento, embora de vez em quando o treinamento assim o exige ou mesmo as patrulhas de fronteira.

Existe algo que posso falar sobre isso, independente da investigação do TCU. Acho, por uma visão de saúde, um absurdo consumir tanto lei condensado. É muito açúcar e isto significa um potencial de doenças muito grande. Se o Brasil tivesse um Ministro da Saúde, creio que ele aconselharia um uso mais discreto do açúcar.

Que o presidente use leite condensado isso faz parte do seu estilo de vida e seu gosto pessoal. Mas como política de alimentação, o item é altamente discutível. Leio que São Paulo está falando em vender a Coronavac para países da América do Sul, caso o governo não queira comprá-la.

Preciso entender bem essa operacão. O Brasil não tem vacinas suficientes. Se o governo federal não quiser comprá-las porque não vendê-las para os estados, uma vez que já foram aprovadas pela Anvisa. A Bahia está brigando para importar a Sputinik V, que ainda não tem a aprovação para uso emergencial.

Essa relação entre São Paulo e o governo federal está muito politizada. Vou me informar melhor, mas em princípio, sem menosprezar a importância dos países vizinhos, acho que deveríamos tentar chegar à meta das 150 milhões de pessoas vacinadas.

Prefiro acreditar que essa história de exportação é apenas uma forma de pressionar o governo para que compre as 54 milhões de doses extras. Espero até que a pressão seja bem sucedida. Mas quando há luta política intensa, os interesses da sociedade acabam ficando em segundo plano.

E realmente deixar de vacinar 22 milhões de pessoas, contando duas doses, seria uma perda inexplicável. Leio que por falta de dinheiro pode ser suspenso o abastecimento de água no Nordeste e em parte de Minas. O serviço de carros pipas é administrado pelo Exército e cheguei a fazer um programa sobre o tema, percorrendo as regiões atendidas no Nordeste.

Será um desastre se o abastecimento for cortado. E parece que o preço do serviço que deve atender umas cinco milhões de pessoas está em torno de R$650 milhões. De novo, entra a reflexão sobre prioridades: chicletes, leite condensado não são tão essenciais como a água. Isso acho que é tão cristalino que talvez nem divida direita e esquerda, como tantos outros temas.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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