“Lira continuará a ser o ‘primeiro-ministro’ do Brasil”

Três perguntas para Aldo Rebelo

Aldo Rebelo, ex-presidente da Câmara, deputado federal por seis mandatos e ex-ministro do governo Lula, fala de poder e da eleição para a Mesa Diretora da Câmara.

1 – Quão poderoso se sente alguém que se elege presidente da Câmara?

Muito poderoso.

Primeiro, porque o presidente da Câmara é, no Brasil, o único cidadão capaz de iniciar um processo de impeachment contra o presidente da República. Ninguém mais pode. Entre 215 milhões de brasileiros, só um tem essa atribuição.

Quando eu fui presidente da Câmara, arquivei 32 processos contra o presidente Lula e arquivaria também se fosse contra a ex-presidente Dilma ou o ex-presidente Bolsonaro, porque eu acho que presidente é o povo quem elege. Mas o Legislativo ganhou muito poder e muitas atribuições na Assembleia Nacional Constituinte, inclusive porque, na transição do regime ditatorial para o democrático, havia uma ampla desconfiança do Legislativo sobre o Executivo, que havia fechado o Congresso e cassado seus representantes.

Então, hoje, a Câmara é a instituição que já afastou dois presidentes da República: Fernando Collor e Dilma Rousseff. Michel Temer só não foi afastado porque, na prática, abdicou de governar e entregou o poder à Câmara.

É muito ruim um governo brigar com o presidente da Câmara. Por ele ter o poder de definir o que será votado ou deixará de ser votado, e ter também a prerrogativa de escolher os relatores das matérias, o presidente da Câmara pode criar muitos problemas para o governo — por exemplo, se resolver trancar uma determinada pauta ou apontar um adversário do presidente para relatar determinado projeto.

Isso significa que, se o governo estiver bem, o presidente da Câmara pode criar muitos problemas para ele. E, se o governo estiver mal, o presidente da Câmara pode derrubá-lo.

O poder dele é decisivo.

2 – Quão poderoso será Arthur Lira caso se reeleja presidente da Câmara?

No governo anterior, o Arthur Lira era apontado nos bastidores como o primeiro-ministro do Brasil. Neste governo, continuará sendo. Isso porque o presidente Lula, com todo respeito, não tem votos na Câmara. Ele tem apenas os votos da coligação que o ajudou a se eleger — o resto ele vai ter de disputar.

Mas, a princípio, nessa relação de força, a vantagem é sempre do governo. Quem tem os ministérios, o Tesouro, o Banco Central, o Banco do Brasil, a Caixa e outros instrumentos de poder é o governo. Então, a vantagem é sempre dele.

Agora, essa vantagem existe desde que o governo acerte, e não cometa erros graves — o que, no caso deste que começa, significa, por exemplo, ceder aos agentes de desestabilização que existem dentro dele e assim perder a confiança, inclusive, dos políticos.

É como diz o pessoal: casamento com governo é só na saúde e na alegria. Na doença e na tristeza, esqueça.

3 – Qual o segundo cargo mais cobiçado da Mesa, fisiologicamente falando?

É o de primeiro-secretário. O poder dele é muito grande sobretudo porque tem um orçamento gigantesco para administrar. Estados do Brasil não têm o orçamento que a Câmara tem. E o primeiro-secretário é quem autoriza, chancela as despesas da Casa, assina contratos para comprar água, café, para contratar milhares de terceirizados. O primeiro-secretário é o tesoureiro, o ministro da Fazenda da Câmara.

Mas eu não chamaria de “fisiológica” a disputa por esse poder.

Por que o poder disputado pelos políticos é fisiológico e o das empresas não é? Acabou de ter uma disputa por poder na Fiesp. Há disputa por poder na esfera política, econômica, eclesiástica, jornalística. Vocês [jornalistas], quando chegam numa redação, a primeira coisa que fazem é botar os amigos nos cargos mais importantes e tirar dali os que não conhecem.

Poder é poder.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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