Os golpistas legalistas

Militares do segundo escalão da tentativa de golpe apostavam em tese jurídica para convencer chefe do Exército.

A necessidade de argumento jurídico foi um dos assuntos mais comentados pelo segundo escalão do planejamento golpista. Haver uma tese jurídica que se amoldasse o máximo possível à Constituição de 1988 era o que faltava para convencer o general Freire Gomes, segundo militares e ex-militares que eram insuflados por Jair Bolsonaro.

Sabe-se agora que o ex-comandante do Exército e Baptista Júnior, então chefe da Aeronáutica, ganhavam tempo para impedir Bolsonaro de trocar encarregados das forças resistentes ao golpe. Mas, entre novembro e dezembro de 2022, os militares Mauro Cid, Ailton Barros, Laércio Vergílio, Bernardo Romão acreditavam que Freire Gomes tinha medo das consequências caso o plano falhasse.

Laércio cita em conversa com Ailton Barros que o currículo do advogado Ives Gandra Martins pesaria para convencer Freire Gomes de que o golpe era uma forma de garantir a democracia.

Ives Gandra criou a tese, argumentando que as Forças Armadas também eram Poderes e que tinham como missão garantir a harmonia entre os poderes. É com esse espírito que Laércio diz à PF que defendeu a prisão de Alexandre de Moraes, num áudio enviado a Ailton Barros, “para volta da normalidade institucional”.

Sem convencer Freire Gomes, seria preciso trocar a chefia do Exército, pois a Marinha, sozinha, não teria poder para impedir a posse do governo eleito. A saída buscada pelo bolsonarismo, segundo suspeita a Polícia Federal, seria o general Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira, que se reuniu três vezes com Bolsonaro no fim de 2022.

Bernardo Romão afirma à PF que foi procurado por Mauro Cid para repassar ao colega o telefone de Cleverson Ney, assistente de Theophilo. Segundo Romão, Cid estaria interessado em Gaspar de Oliveira – para o lugar de Freire Gomes – porque o militar teria perfil de “alguém que pudesse cumprir ordens”.

Em seu depoimento à PF, Theophilo garantiu que só conversou amenidades nas três reuniões que teve com Bolsonaro, entre novembro e dezembro de 2022; duas delas com Freire Gomes. Afirmou que compareceu ao terceiro encontro, em 9 de dezembro, porque o então chefe do Exército mandou.

Nesta mesma data, segundo áudio obtido pela PF, Jair Bolsonaro mexeu na minuta do golpe. Ao ser confrontado com a informação, Theophilo se calou.

Para piorar, Freire Gomes contradiz Theophilo. Afirma que nunca deu ordem para visita a Bolsonaro. Também destaca à PF que não gostou da ida do subalterno ao então presidente sem autorização. Atos assim são considerados quebra de comando dentro da caserna.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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