Monark comete o equívoco do jovem liberal em seu podcast

Parabéns a Tabata Amaral pela elegante defesa da razão no caso do Flow

Há um equívoco conceitual grave entre os jovens liberais no Brasil, fruto da péssima formação do debate liberal entre nós, recusado pelas universidades e dominado por empresários e afins que limitaram quase sempre o repertório à liberdade de mercado e seus interesses. O resultado está aí. Cada dia uma polêmica vazia aparece que serve à estupidez comum das redes sociais e afins.

caso Monark é paradigmático. Monark do Flow não é nazista ou antissemita, mas errou feio. Convergem vários fatores na sua estúpida defesa recente da liberdade de expressão para um partido nazista no Brasil.

Primeiro, o sucesso deveria ser permitido apenas a pessoas com mais de 40 anos. O sucesso é um fator corrosivo da nossa capacidade de visão de mundo, de avaliação do ridículo que nos cerca e nos constitui, e da dúvida que sempre devemos alimentar em relação a nossas próprias certezas. Um jovem não enxerga nada disso, na sua imensa maioria. Confunde ganhar dinheiro e sucesso com entender o “segredo último das coisas e do mundo”.

O sucesso prematuro na vida, como é o caso do Monark e de muitos outros como ele, facilmente destrói um maior cuidado na lida com o mundo e as pessoas. Produz o que ele mesmo chamou no seu vídeo de desculpas de “insensibilidade”. O sucesso prematuro pode levar a cegueira mesmo com muito dinheiro.

Outro elemento é o ethos das redes sociais. Afora os evidentes ganhos que a acessibilidade das redes gera, elas, de fato, alimentam a imbecilidade, como dizia Umberto Eco (1932-2016). E aqui, não me refiro ao caso Monark especificamente. Basta acompanhar comentários aos textos e vídeos para ver essa imbecilidade claramente. As redes praticam uma linguagem pobre e agressiva. Enfim, uma semântica para o uso dos idiotas ressentidos.

Por exemplo, nos comentários ao vídeo em questão são muito claros a elegância e o cuidado com os quais a deputada Tabata Amaral se move diante dos argumentos descabidos do podcaster —fala devagar, usa as ideias de forma consistente, respeita a fala do outro. Corretíssima no seu argumento contra o absurdo da defesa da legalidade do partido nazista, ela, ainda assim, foi objeto de críticas cretinas nos comentários.

Às redes só interessa xingar, linchar e mostrar falsos repertórios. Não há esperança nenhuma de que as redes venham a desenvolver maturidade nas sociedades porque a cada minuto entram milhões de idiotas nelas.

Outro elemento é a estética “clube da luta” —refiro-me ao filme “Clube da Luta”— que marca os espaços físicos dos podcasts. Essa estética “clube da luta” faz parecer que encher a cara, fumar maconha e chutar o balde 24 horas por dia é cool e faz de você um ser livre.

Mas, além desses reparos de contexto, há o equívoco essencial de jovens liberais como Monark —a fetichização da ideia de liberdade, e, por tabela, de liberdade de expressão. Não existe nenhum valor absoluto, e os jovens liberais no Brasil têm brincado com ideias.

A liberdade, como tudo mais no âmbito moral e político, é segunda, sendo ela determinada por fatores de contexto, de linguagem, de leis, de história, de economia, de política, enfim, uma série exaustiva de fatores. A liberdade não é um valor absoluto, talvez nenhum seja. Mesmo não matar é relativizado em revoluções ou guerras para aqueles que as defendem. Essa relatividade da moral e da política nos ocupa o tempo todo, de forma exaustiva.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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