Não é só isso que se vê

Quantos de fora do Rio saberão que a Mangueira é muito mais que o endereço do seu barracão?

Quando a Mangueira pisar o Sambódromo na madrugada desta segunda-feira, levantará a avenida, como faz em todos os Carnavais. Sua torcida é imensa e nacional. Quantos de fora do Rio, no entanto, sabem que, assim como as outras escolas cariocas, Mangueira não é só o endereço de um barracão, mas uma comunidade que já se via e se sabia como tal desde o século 19, muito antes do primeiro tamborim? E que como tal foi cantada em samba e verso por muita gente boa? Exemplos.

“Em Mangueira, na hora da minha despedida/ Todo mundo chorou, todo mundo chorou/ Foi pra mim a maior emoção da minha vida/ Porque em Mangueira o meu coração ficou…”, de Benedito Lacerda e Aldo Cabral, no Carnaval de 1940. “Mangueira/ Onde é que estão os tamborins, ó nega/ Viver somente de cartaz não chega/ Põe as pastoras na avenida/ Mangueira querida”, de Pedro Caetano, em 1947.

“Aquele mundo de zinco que é Mangueira/ Desperta com o apito do trem/ Uma cabrocha, uma esteira/ Um barracão de madeira/ Qualquer malandro em Mangueira tem…”, de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira, em 1952. “Fala, Mangueira, fala/ Mostra a força da tua tradição/ Com licença da Portela, Favela/ Mangueira mora no meu coração…”, de Mirabeau e Milton de Oliveira, em 1956. “Levanta Mangueira/ A poeira do chão/ Samba de coração/ Mostra a sandália de prata da mulata/ A voz da cuíca e o tamborim/ Mostra que o samba nasceu em Mangueira, sim…”, de Luiz Antonio, em 1959.

Mas como superar este samba de 1968? “Vista assim do alto/ Mais parece o céu no chão/ Sei lá, em Mangueira a poesia, feito um mar, se alastrou/ E a beleza do lugar, pra se entender/ Tem que se achar/ Que a vida não é só isso que se vê/ É um pouco mais/ Que os olhos não conseguem perceber/ E as mãos não ousam tocar/ E os pés recusam pisar/ Sei lá, não sei/ Sei lá, não sei…”.

De Hermínio Bello de Carvalho e do portelense Paulinho da Viola.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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