Prenúncio da tragédia

Bolsonaro e Lula confirmam na eleição um Brasil (ainda mais) dividido que em 2018. Dividido, agora de modo explícito, direita e esquerda com bancadas definidas, de credo claro por um lado e outro. Um deles será o próximo presidente, mas com o fracasso retumbante das pesquisas não se pode mais acreditar em predições de que vencerá este ou aquele. Um dado interessante, mais metafísico que científico, foi levantado pelo jornal Meio: desde o início do sistema de dois turnos, nenhum presidente no cargo deixou de ser reeleito.

No entanto, sempre há uma primeira vez e ela pode ser exato agora, com o equilíbrio entre Lula e Bolsonaro e com a confirmação de que o atual presidente elegeu não só sua bancada (96 deputados federais contra 66 de Lula) como conseguiu espécie de absolvição prévia ao eleger ministros controversos – e de gestões caóticas, controvertidas, mesmo criminosas – como o da Saúde, Eduardo Pazuello, do Ambiente, Ricardo Salles e da Mulher, Damares Alves.

Não se pode ignorar o risco de seu candidato, também ex-ministro Tarcísio de Freitas, ser eleito governador de São Paulo, superando Fernando Haddad, excelente ministro da Educação de Dilma, ex-prefeito de São Paulo, candidato competitivo de Bolsonaro em 2018. Tarcísio é vitória a ser creditada a Bolsonaro, pois foi disputa entre sua criatura e a de Lula. O Uol apresenta sugestiva imagem gráfica do resultado das eleições: o mapa do Brasil, metade azul, metade vermelho, as cores dos dois candidatos.

Bolsonaro veio para ficar – e destruir. Falar em destruir é plausível e justificado, pois foi o que fez até agora, seja no ambiente, seja na administração pública, seja na imagem das instituições, na manipulação do Legislativo e das Forças Armadas, seja na tentativa de abalar o Judiciário e o sistema de freios e contrapesos. Ele quer dominar, sufocar e impor uma visão de mundo da Guerra Fria, do antagonismo do bem (ele) e o mal (os que não se submetem a ele). Bolsonaro estava como Lula de antes de ser eleito.

Lula disputou três vezes a presidência, nunca ultrapassando os 30% dos votos, como comentava o ministro Delfim Netto para acalmar os temores da Direita (até que, Lula eleito, passou de admirador a conselheiro do então presidente). Bolsonaro foi além dos 30%, chegou aos 40, firmando-se como liderança com mais força que o Lula de antes – com quem aprendeu e aplicou métodos do Mensalão, fugiu dos da Lava Jato e hoje pratica aqueles que derrubaram Dilma nas Pedaladas.

Bolsonaro ousa confiante em na impunidade, o efeito teflon, do qual Lula se julgava detentor, o que não foi suficiente para poupar Dilma do impeachment, nem ele, Lula, da prisão. Se Bolsonaro chegará lá, eleito ou não eleito, o tempo dirá. O que importa é o panorama com o qual chegou ao segundo turno: liderança nacional, bancadas fortes e a vitória de um discurso autoritário e obscurantista. E pelo voto popular, do qual duvidava antes e enaltece agora; o qual tentou obstruir ao pedir ao TSE a redução da oferta de transportes aos eleitores.

Um projeto de ditador eleito e celebrado pelo voto popular. A História não ensina, apenas lembra os que se interessam por ela; os indiferentes, ignorantes e estúpidos tendem a repeti-la como tragédia, escreveu o comunista com o qual Jair Bolsonaro assusta seus eleitores infantis. Lembro a Alemanha, em 1933, que elegeu com votação e consagradora o líder de um partido preconceituoso como o de Bolsonaro: o líder chamava-se Adolf Hitler; seu partido, o Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, ou Nazista.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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