No fundo, no fundo, no fundo…

No fundo, no fundo, todo cheque é sem fundos. No fundo de qualquer gaveta tem outra gaveta, muito mais profunda. No fundo do mar, o abismo se abisma consigo mesmo. No fundo da memória imobiliária, as casas tinham fundos.

No fundo das fendas, há frestas para outras profundezas. No fundo, os fundilhos não terminam ali. No fundo dos sofás há gente que se afundou e nunca mais foi vista. No fundo, até as coisas mais rasas têm a sua incalculável fundura. No fundo das tumbas, múmias de órbitas fundas contemplam as partes mais curtas da eternidade No fundo das redes busca-se uma profundidade maior para o futebol. No fundo dos mais fundos poços de elevadores se acumulam vertigens das alturas. E no fundo bem fundo dos poços, a caçamba passa sede. No fundo das coxias, depois que o teatro se afunda na escuridão, nem as sombras contracenam.

No fundo da fundição, numa fornalha metafísica, fundem-se o tudo e o nada. No fundo do inafundável Titanic afundou-se o mito da tecnologia perfeita. No fundo dos teus olhos eu me olho e me vejo melhor.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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