O golpe está no ar?

As forças democráticas devem se mobilizar desde já para resistir à ameaça de recaída autoritária. E dar um basta aos generais golpistas

Em artigo recente que se tornou um dos mais lidos aqui no Ultrajano, nosso admirado Frei Betto lembrou episódio envolvendo seu pai em 1964 e se disse preocupado com os ventos golpistas que estão soprando neste ano de 2022, marcado por eleições para  a Presidência da República. Esta semana, o professor Paulo Sérgio Pinheiro, renomado cientista político, também expôs, em artigo reproduzido pelo site 247, seus temores sobre o que pode acontecer no processo eleitoral. Segundo ele, há meses pairam dúvidas sobre a posição das Forças Armadas diante de eventual golpe ou tumulto antes ou depois das eleições. “Agora, todas as dúvidas se dissiparam. Se levarmos em conta recente manifestação do ministro da Defesa ao Tribunal Superior Eleitoral, o alinhamento daquelas com a linha golpista do presidente parece ter se consolidado”, afirma o professor.

Elio Gaspari, que conhece a fundo o pensamento dos militares, adverte que “quando o presidente da República sopra ventos golpistas e o ministro da Defesa, ex-comandante do Exército, repreende o Tribunal Superior Eleitoral”, é bom ficar atento. Por mais remota que seja a ameaça, “admita-se que existem pessoas preferindo um golpe”, diz o experiente jornalista, autor de obra celebrada sobre o período da ditadura militar. Muita gente também está espantada com a distribuição farta de armas para bolsonaristas e os afagos generosos ‒ com promoções e reajustes salariais ‒ para as polícias militares nos estados. Hoje mesmo, o governador do Rio de Janeiro, ligado a Bolsonaro, anunciou bônus de R$ 59 milhões para policiais civis e militares.

Teme-se que essa milícia de extrema-direita entre em campo assim que as urnas eletrônicas confirmarem a vitória do ex-presidente Lula. Mais grave ainda: a virada de mesa teria o apoio dos generais que cercam o presidente mais medíocre de nossa história. Aí está o ministro da Defesa, general Paulo Sérgio de Oliveira, a fazer pressão sobre o TSE e insistir que as Forças Armadas têm todo o direito de intervir no processo eleitoral. De propósito, o general confunde a segurança do transporte das urnas com a responsabilidade pela lisura das eleições. Mas, como já disse o ministro Edson Facchin, quem trata de eleições no Brasil são as “forças desarmadas”, ou seja, a sociedade civil.

Enquanto o general se intromete em seara alheia e afirma que “não nos interessa concluir o pleito eleitoral sob a sombra da desconfiança dos eleitores”, o Exército assiste impávido à tomada da Amazônia por milícias e traficantes de drogas. E nada faz para evitar a invasão de terras indígenas. Diante do desaparecimento do jornalista inglês Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira, o Comando da Amazônia explicou numa nota oficial patética que estava aguardando “ordem superior” para agir. O Exército ficou de braços cruzados enquanto Dom e Bruno eram perseguidos por marginais no Vale do Javari e, ao que tudo indica, brutalmente assassinados.

Porém, em seu desvio da função das Forças Armadas prevista na Constituição, o general Paulo Sérgio de Oliveira só tem olhos para a eleição de outubro. E não esconde de ninguém que seus comandados podem questionar o resultado do pleito. Explica-se, assim, a certeza de Elio Gaspari em seu artigo desta quarta-feira: “Existem pessoas que flertam com o golpe”. Uma das hipóteses é que milicianos e militares golpistas tentarão evitar a diplomação de Lula, inspirados no 6 de janeiro de 2021, quando as hordas de Trump invadiram o Congresso dos EUA, em Washington.

Há que concordar com o professor Paulo Sérgio Pinheiro. Esse cenário golpista é “assustador, obsceno, patético”. O perigo está no ar e exige que as forças democráticas se mobilizem desde já para resistir à ameaça de recaída autoritária. Só assim o resultado das eleições de outubro será respeitado. Não basta redigir manifestos e notas de protestos. E nem contar apenas com a ação de entidades tradicionais, como a ABI, a OAB, a CNBB, a SBPC e a Comissão Arns. A tarefa é dos homens e mulheres que acreditamos na Democracia.

Octávio Costa

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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