O número e o algarismo

O DEPUTADO OSMAR TERRA, ex-ministro da Cidadania, essa redundância – os ministérios servem ao cidadão -, comenta o total provisório de vítimas do covid-19 com a falta de empatia dos bolso-adoradores: até agora são “só 10 mil mortos”. No que recebeu resposta de Luiz Henrique Mandetta, ex-ministro da Saúde, a quem Terra pretendeu substituir: os mortos não são números, são seres humanos.

Como a anestesia campeia neste Brasil indiferente, cabe-nos apenas dizer que os dois desrespeitam Platão, o filósofo grego. O discípulo e divulgador de Sócrates ensinou que o número é a ideia abstrata, que se materializa no algarismo, a quantidade. Nessa sem-cerimônia da metafísica os dois acabaram por se confundir, número e algarismo a mesma coisa, sinônimos. Faz diferença? No Brasil, nenhuma.

Portanto, os dez mil mortos da pandemia são o número, a ideia abstrata de nossa esquecida humanidade. Os dez mil mortos da pandemia são o algarismo da desumanidade de nossos homens públicos – excetuado Mandetta. No íntimo, o ex-ministro da Saúde converge para o rigoroso platonismo. Platão, a propósito, foi quem introduziu a ideia do monoteísmo na filosofia, base da teologia católica.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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