O que deu em Lula?

Será que o radar político do presidente já não é mais o mesmo?

O que aconteceu com Luiz Inácio Lula da Silva? É verdade que, como todo político que abusa de falas de improviso, ele sempre disse muita bobagem. Quem se der ao trabalho de fazer uma busca nas coleções dos jornais encontrará farto material. Mas a maior parte das gafes pretéritas era do tipo pouco comprometedor. O que chama a atenção agora é que o presidente parece insistir em declarações que claramente o prejudicam, seja por afetar negativamente expectativas para a economia, seja por criar arestas políticas desnecessárias.

Parte da explicação está no fato de que foi o mundo e não Lula que mudou. Vivemos hoje um clima de polarização afetiva que inexistia 20 anos atrás. Falas que antes passavam batidas ou eram no máximo vistas como piadas involuntárias são agora analisadas sob microscópio e interpretadas como declarações de guerra. O ponto é que Lula, frequentemente descrito como um “animal político”, deveria ser capaz de compreender as mudanças contextuais e evitar as armadilhas. Não está sendo.

Precisamos, é claro, considerar a possibilidade de que Lula esteja enxergando mais à frente do que todos nós e tomando decisões racionais. Nesse caso, uma explicação para a repetição dos ataques ao BC é que o presidente já tenha concluído que seu governo não conseguirá promover o espetáculo do crescimento insinuado na campanha e já esteja providenciado bodes expiatórios a que culpar.

A tese é plausível, mas tem fragilidades. Ela não explica as escorregadas políticas, como as acusações sem provas contra os EUA e Moro. Ela também parte de uma premissa complicada, que é a de que Lula já tenha descartado um cenário de crescimento robusto. Políticos não costumam ser muito pessimistas (e nem mesmo realistas) nessas avaliações, ou nem disputariam algumas eleições.

Outra hipótese é que o radar político do presidente não seja mais o mesmo e ele esteja de fato cometendo erros em série.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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