O que sumiu e o que voltou

Perdeu-se a arte de bater carteiras e desaprendemos a aplaudir sentados, mas está de volta o estrogonofe

Começou há algumas semanas, quando me gabei de ter sido um grande chutador de tampinhas, daquelas de refrigerante, soltas nas calçadas. Dias depois, um leitor perguntou se eu era capaz de dar o piparote com o sapato na borda da tampinha, fazê-la subir e matá-la no peito do pé. Humilhado, tive de confessar que não. E, agora, outro leitor, para meu opróbrio supremo, escreve para dizer que no peito do pé era fácil —ele queria ver era se o sujeito fazia, como ele, a tampinha pousar no lado do pé. Tudo isto porque observei que, por falta das próprias, ninguém mais chuta tampinhas pelas ruas.

Muita coisa deixou de existir por falta de matéria-prima. Por exemplo, ninguém mais escorrega em cascas de banana. Continua a chover, mas não se usam mais galochas. Ninguém mais cheira rapé ou sopra chicletes de bola. Ninguém mais usa boina, só boné, e, mesmo assim, ao contrário. Artigos de primeira necessidade como o pote de goma arábica, o mata-borrão e a espátula para abrir cartas deixaram de existir. Ninguém mais lambe selos para pregar no envelope. Eu próprio há anos não lambo um selo e não escrevo ou recebo uma carta.

Velhos hábitos desapareceram. Desaprendemos, por exemplo, a aplaudir sentados. Qualquer showzeco nota 3, se aplaudido, é hoje aplaudido de pé. Em breve, teremos de plantar bananeiras para premiar uma performance verdadeiramente genial. E perdeu-se de vez a arte de bater carteiras. Os atuais meliantes não se valem mais de dedos leves e hábeis para subtraí-las de nossos bolsos. Vão direto de trabuco no nariz, até porque, com o celular e o pix, já quase não se usam carteiras. .

Em compensação, coisas há muito dadas como extintas estão voltando espetacularmente. Uma delas é o bigodinho, fora de moda há uns 70 anos. Os garotos voltaram a jogar bafo com as figurinhas. E até o estrogonofe voltou.

Mas preocupante mesmo é a volta do nazismo.

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Ninguém pode salvar este país!

ninguem

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Mural da História – 2009

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Diário de Bordo

Houve quem dissesse que, um dia, voamos no Morcego Negro, o jatinho do PC Farias, às expensas do governo Collor: eu, Sergio Mercer e seu bandoneon imaginário rumo ao Planalto Central. Fosse verdade e teria sido uma viagem inesquecível pelo que posso imaginar. Mas pouco acrescentaria ao que tenho para contar acerca dessa que foi nossa maior peripécia.

Alguns anos antes da aventura que nos levou aos bastidores da República do Jet-Ski, é preciso que se diga, eu já havia viajado muitas vezes em companhia do Mercer. Foram viagens mais pedestres, mas justamente por isso muito mais divertidas do que nossa fugaz experiência com o chamado Poder.

Que ante-salas ministeriais poderiam ter sido mais luminosas do que todos os bares por onde acompanhei o cantor e dançarino Sergio Mercer em turnê de uma noite, apresentando impagável improviso jazzístico do samba “Emília”? Que passeio entre repartições públicas teria sido mais inspirador do que nossas freqüentes viagens entre as Mercês do Bar Botafogo e o Bacacheri do Bar Sem Nome?

Nenhum evento da Esplanada, por certo, mais me emocionaria do que ver sair do forno a extraordinária “Marcha do Porco Chauvinista”, interpretada pela dupla de autores, & Mercer & Solda, no Bar Rei do Siri. Ou, então, o tango tragicômico que, se a memória curitibana merecer confiança, terá imortalizado esse já desaparecido bar.

Os comediantes federais nada teriam para me oferecer de mais engraçado do que o convite feito pelo Presidente da Fundação Cultural de Curitiba, Sergio Mercer, para eu escrever, em 30 dias, a revista musical de inauguração do Teatro de Bolso em homenagem aos comediantes municipais.

Qual job publicitário proveniente dos meandros da Casa da Dinda poderia ser mais desafiador do que ajudar a dar forma à campanha do “Coração Curitibano”, criada pelo Mercer, Solda e pelo Zanoni para o nosso amigo Jaime Lerner?

Em suma, não precisávamos de Brasília para nada. No entanto, ela passou a fazer parte do nosso destino no exato momento em que Alceni Guerra assumiu o Ministério da Saúde e o curitibano Heitor Gurgel do Amaral Valente Neto tornou-se seu assessor especial.

Heitor queria uma grande idéia para a gestão do Alceni e, por isso, resolveu promover um brainstorm na Capital Federal, reunindo Sergio Mercer, Antonio de Freitas, Cleto de Assis e eu. O encontro aconteceu na casa do Cleto, que nos hospedou e recebeu a parte paranaense da República as Alagoas com um jantar capaz de arrancar suspiros do Barão de Tibagy.

Naquela circunstância, nosso grupo já havia constituído um pool e o tal do brainstorm não passara da idéia de abrir em nossas cabeças o job psicológico que, sumariamente, solicitava uma proposta de impacto que desse notoriedade ao Ministro da Saúde.

No dia seguinte, vencida a ressaca e com esse job dormindo em alguma dobra da alma, Sergio Mercer e eu embarcamos em um avião da Varig com destino a Curitiba. Em dado momento da viagem, o Mercer sugeriu que pensássemos em algo para as crianças. Eu olhei para ele e provoquei: que tal um Ministério da Criança?

Bem, não é preciso dizer que aterrisamos em Curitiba com o Ministério da Criança completamente concebido. Antes de nos despedirmos, o Mercer lembrou que seria prudente conseguirmos um japonês que transformasse aquela idéia em um projeto. Respondi que não seria necessário, pois eu mesmo poderia fazer esse trabalho.

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Barrio Gótico

BarcelonadoisSolda, numa tarde tórrida no Barrio Gótico em Barcelona Carmen Lúcia e eu entramos no botequim Los Picantes e nos entupimos de viño blanco heladito e pulpo a valenciana. O proprietário, Señor Urtiga y Basset, de maus bofes, nos tocou desalmadamente do local para poder hacer la siesta tranquila. Foi o fim da picanha como dizia um amigo italiano. Era 1985, século XX. D.C. Amplexos, Dico Kremer

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Os desclassificados do Prof. Thimpor

Coragem – Compro ou alugo. Dou como garantia 18 anos da mais absoluta covardia. Não aceito ousadia nem perspicácia. Tratar com Rutildo – Rua Trindade, s/n – Ilhéus/BA.

Aviso – Quem avisa, amigo é. – Avisador Misterioso – Londrina/PR.

Mãe – Em ótimo estado, pura como um anjo, cabelos encaracolados, meio gordinha. Não surra ninguém, cozinha pra chuchu e abre a porta pra gente de madrugada. Vendo ou troco por tia bem apanhada que saiba engomar camisas e cuecas. Falar com Romão, no Bar Peixe Frito – Rua Anatole France, 123 – Castro/PR.

Bicho-de-pé – Para senhoras e cavalheiros, de todas as espécies. Não vicia, não tem contra indicação e dá saúde e alegria, além daquela coceirinha gostosa no dedão. Temos também a última novidade européia, que é um bicho-de-pé sentado, em diversas cores e tamanhos. Atendemos aos sábados e domingos, depois do Programa Sílvio Santos. Tratar com Vadico – Rua Cristo Rei, 240 – Curitiba/PR.

Problemas – Resolvo todos, desde palavras cruzadas até equações complicadas e brigas de rua. Salete. Rua Caramaí, 11 – Itú/SP.

Aviso – O cão é o melhor amigo do homem, quando a onça não está por perto.  Avisador Misterioso – Londrina/PR.

Bicicleta – Jogador de futebol, 35 anos, especialista em gols de bicicleta, oferece-se para trabalhar em qualquer time que esteja precisando desse tipo de atleta. Faço gols de escanteio de olhos fechados. Sebastião “Foguetinho”- Rua Ases de Cataguases, 456 – Alfenas/MG.

Surro! – A primeira pessoa que aparecer na minha frente cantarolando essas musiquinhas idiotas de baiano! Eu baixo o cacete! Eu mando ver! Música caipira também não é comigo! – Avisador Misterioso – Londrina/PR.

Tijolos – Educadíssimos. Andam sempre juntos. Em jantares pedem sempre filé de badejo com batatas e purê de espinafre. Alugamos. Olaria do Thadeu – Rua Caifás – Itú/SP.

Aviso! – Não se deve cutucar a onça com vara curta – Avisador Misterioso – Londrina/PR.

Marilda – A chave está debaixo do vaso de dinheiro-em-pencas, na área. Se você chegar antes de mim, esquente o feijão. Talvez eu leve alguma carnezinha pras crianças. Ernesto Barraí – Rua Portugal, 456 – Curitiba/PR.

Pirâmide. – Em perfeito estado, localizada no Egito, cercada de areia por todos os lados, três quartos, suíte, 1.028 salas, 3.450 banheiros e garagem para 14.000 carros. Totalmente financiada em 40 séculos, entrada parcelada. Imobiliária Quéops – Rua Ivaí,s/n – Itararé/SP.

Aviso – Os últimos serão os primeiros, mas a porta já estará fechada. – Avisador Misterioso – Londrina/PR.

Aviso – Dize-me com quem andas e direi se vou contigo. – Aparício Torelly, Barão de Itararé, A Manha – Rio de Janeiro/RJ.

Guarda-chuva – Vendo, de porte médio, meio gago e meio bobo. Aceito figurinhas carimbadas – Pinga, Dida, Olavo e Canhoteiro – como parte do pagamento. Herman Del Catita – Rua Santo Inquérito, 34 – Alegrete/RS.

Pacotes – Não guardamos a fim de evitar embrulhos. Bar Fecha Nunca – Rua São Pedro, 240 – Itararé/SP.

Garrafa Térmica – Estranhíssima, porém ótima pra quem gosta dessas coisas. fala francês e italiano. Pula da mesa às três e meia da tarde e muda de cor assim que o relógio marque hora cheia. Fez cursos de conservação de líquidos em Tarétsias. Troco por comleção completa da Revista do Rádio. Eliete C. Abril – Rua Sarongue, 123 – Sengés/PR.

Pão de Açúcar – Vendo. Excelente localização. Preço a combinar. Aceita-se o Cristo Redentor como parte do pagamento. César Stradivarius – Rua Morgue, 2 – Alfenas/MG.

Óculos – Claros e escuros, todos com vista para o mar. Ótica Mirabel – Rua dos Alemães, 34 – Joinville/SC.

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© Furnaius Rufus

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Occam!

tamanduá-tau© Glerm Soares|Solda

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Nina North © Zishy

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Laura e Joice contra o vento

Dona Laura mudou-se de novo; saiu uma vez porque o apartamento era frio, ficou um tempo fora e não sossegou até comprar o apartamento quente aqui mesmo. Morar em Curitiba requer a sorte de cair no lado norte ou no lado sul; no primeiro a casa é quente, no outro é fria. Pior que o curitibano, como o brasileiro em geral, não se orienta pelos pontos cardeais, como a gente vê qualquer imbecil fazendo em filme americano. O norte e o sul são leros de corretor para empurrar imóveis – que, melhores que sejam, dia mais dia terão o espigão a tirar-lhes o sol, pois Curitiba tem dono, os especuladores imobiliários e os donos dos ônibus que contratam prefeitos e vereadores para o serviço sujo. Dona Laura caiu nessa e veio para cá, saiu e voltou. Uma mulher, diziam, de mal com a vida, solitária, azeda, barraqueira; para mim um doce de pessoa, interessante e engraçada em estado de repouso e melhor ainda quando adotou o pincher, substituto da filha que se mandou para a Bélgica.

Venci a prevenção contra Guarapuava graças a dona Laura. A prevenção vinha da universidade com os cascas grossas barulhentos do centro acadêmico. Dona Laura, casca grossa fascinante, conquistou-me no aparte durante a reunião do condomínio: “não se meta comigo que sou de Guarapuava; lá as mulheres mijam em pé contra o vento e não molham as canelas”. Muitas vezes compartilhei o elevador com dona Laura. Um dia ela me peitou com a pergunta: “por que você fica olhando meus tornozelos?” Inventei uma desculpa, estava curioso com o efeito ventania. Tenho medo de cascas grossas, sou mais a hipocrisia curitibana; saí assim de dentro de minha mãe, ao contrário do presidente Lula, que nasceu valente e destemido, cangaceiro, peixeira na mão petista que se abre nos acordos com o Centrão. Vim de Ponta Grossa, filho de mãe meiga, delicada. Em Ponta Grossa, casca grossa como dona Laura só tem uma: Joice Hasselmann, que mijou contra o vento e saiu ensopada.

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© Jan Saudek

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Um que eu tenho

Jimi-Hendrix-Band-Of-GypsysCapa do vinil original, 1969

banda-de-ciganosBand of Gypsys é o álbum fantástico gravado ao vivo desse trio inesquecível de Jimi Hendrix, ao lado do baixista Billy Cox e do baterista Buddy Miles. São nove faixas em que a lenda da guitarra mostra o melhor de seu estilo, incluindo “Who Knows”, “Machine Gun” e “We Gotta Live Together”, alguns dos destaques. Shows no Year’s Eve, 1969-70 em Fillmore East, Nova Yorque. CD Polydor.

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De sonho e reza-braba

Pesquisas recentes indicaram os sonhos como eficazes antídotos contra o estresse nosso de cada dia. Não sei em que medida isto ocorra. Estresse não me parece coisa que se cure com sonhos. Temos visto, no áspero cotidiano, que, não sendo da aérea matéria deles, o estresse é bem mais um pesadelo da vigília e de sua fatigada astúcia.

Não me canso de lembrar aqui minhas origens e, com elas, o resgate da infância primordial onde a vida mesma era sonho e punha todas as coisas encantadas. Minha avó cabocla, por exemplo, Maria Rosa Custódia de Senes, esta tinha a ciência dos sonhos na ponta da língua. Feito um talismã.

Sonhar com alguém chorando, não hesitava vaticinar: vinha ali dinheiro ou alguma mulher da família estava prestes a parir. Já sonhar com viagens tinha uma nota aziaga — morte certa de compadres ou amigos. Sonhar com um passarinho, era casamento; sonhar com muitos passarinhos (ouviu, Rogério Dias?), anunciava grandes colheitas.

O rol de significados e significâncias, a partir do sonho, era, para a avó, quase inesgotável. Sonhar com chuva, o prolongamento do estio na roça seca; sonhar com alguém voando ou caindo do cavalo, não dava outra — chegariam parentes há muito ausentes.

Também o saber, digamos, erudito, nos reserva coisas prodigiosas sobre os sonhos. Veja o leitor, esta, dos aedos gregos, bem mais interessante que as recentes descobertas da ciência moderna: a prova, entre outras, de que o Inferno existe — incontestável nos demoníacos pesadelos vividos pela alma quando em sono profundo.

Por falar em alma, impossível esquecer o famoso soporífero da planta mandrágora, que, entre os caldeus, causava sono idêntico ao da morte…

Tão ou mais sábia, repito, era a velha Maria Custódia, rezadeira, benzedeira, “costurava” carne rasgada, além de capaz das mais incríveis simpatias para evitar “mau-olhado” que, aquele tempo, tinha outro nome — “quebranto”. Sobretudo criança que não fosse protegida, adoecia gravemente.

Mas pior que mau-olhado, só picada de cobra e, contra ela, a avó tinha um antídoto feroz: “reza-braba”. Verdadeiros mantras caboclos que, incompreensíveis ao comum dos mortais, apenas ela sabia rezar, secretos na mente, secretamente aprendidos de cor.

Dona Maria Rosa Custódia de Senes faleceu em 1967, varada em anos, e descansa, ao lado de minha mãe, no Cemitério de Santa Cândida. Convivi em sua (doce) companhia a primeira década e meia de minha pobre existência e nunca a ouvi falar em estresse ou que sonho curasse estresse. E olha que de sonho e “reza-braba” ela entendia; e não entendia pouco.

O Estado do Paraná, 16 de março de 2008

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A descomunhão evangélica

Os evangélicos da bancada PL estão irritados com seus colegas evangélicos do PSD e do Republicanos, a quem acusam de ter se aproveitado da onda bolsonarista e, agora, ceder às “tentações diabólicas”. O diabo, no caso, é Lula.

Um dos principais alvo da maledicência evangélica do PL é o deputado Silas Câmara (REP-AM), eleito coordenador da Frente Evangélica.

No culto de sua posse estavam presentes três ministros de Lula: Márcio Macedo (Secretaria-Geral da Presidência), Jorge Messias (Advocacia-Geral da União) e Márcio França (Portos e Aeroportos).

Os evangélicos do PL acham que está claro que o Republicanos nem se estabeleceu no governo e já se rendeu a Baal, um deus inimigo do Deus israelense.

O irônico é que o culto de posse se chamava a Santa Ceia de Fé, que basicamente expressa a comunhão entre os irmãos. Mas se tornou, por conta da presença do governo e da aproximação de seus membros, motivo de dissensão. Foi comparado à Santa Ceia, quando se juntaram os discípulos e o traidor de Jesus Cristo.

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