Tempo real

Esta é uma expressão curiosa, surgida, pelo que me consta, com a Internet.  Antes dela tínhamos milhões de coisas acontecendo em tempo real mas não nos sentíamos obrigados a dar um nome a isto. “Em tempo real”, na linguagem de hoje, significa um fenômeno qualquer em que transmissão e recepção sejam simultâneos, ou seja, a coisa acontece num lugar e é vista em outro no mesmo momento.  (Se bem que nada é simultâneo, de acordo com a Física. Há sempre um intervalo, mas em termos da percepção humana é uma fração de segundo tão pequena que para efeitos práticos pode ser ignorada. Para tais grandezas, físicos e matemáticos usam o adjetivo “desprezível”, que sempre me pareceu meio insultuoso.)

Em tempo real significa aquela noite inesquecível em que o U-2 fez um show demolidor num estádio na Califórnia, e eu assisti o show em meu PCzinho no Rio de Janeiro, sentado na minha cadeira giratória, indo buscar cerveja na geladeira. Alguém pode argumentar que se o show tivesse ocorrido na véspera e eu o estivesse vendo 24 horas depois (ou 240 horas depois, etc.) minha impressão de ineditismo seria a mesma, e não discuto.  Aí é que entram as sutilezas do Espírito do Tempo.  O prodigioso não é que a gente esteja vendo aquilo em tempo real, mas que SAIBA que está vendo em tempo real. O prodigioso não é a simples transmissão da informação, mas o pequeno triunfo psicológico que ela nos proporciona, aquela sensação de momentânea onipotência, a sensação de estarmos (a Humanidade inteira, ou pelo menos uma parte importante dela) envoltos num casulo telepático em que tudo nos acontece ao mesmo tempo aqui e agora.  Isto é precioso.

Talvez tenhamos sentido algo assim quando nos deparamos pela primeira vez com o telégrafo; com o rádio; com o telefone; com a televisão; mas isto nunca ocorreu com tanta intensidade. Quando estou num chat, tipo frase-vai, frase-vem, com algum amigo que está na Europa ou na Ásia penso: “Ora, isto não é mais extraordinário do que um telefonema”. Mas telefonemas são uma comunicação um-a-um, e a Internet nos proporciona isto multiplicado por multidões incalculáveis. E reparem bem na poesia do nome.

Todo tempo é real, não é mesmo? Quando leio uma peça de Ésquilo, foi real o momento em que foi escrita, é real o momento da leitura, bem como é real o intervalo de 2.500 anos que nos separa.  Hoje, porém, temos um real simultâneo, e não um real esgarçado no tempo. Como se o fato de outros seres humanos estarem pensando na mesma coisa no mesmo instante tornasse essa coisa mais espessa, mais socialmente verdadeira, mais humanamente real.  E, em última análise, é isso mesmo que acontece.

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Gente mais lenta

Além de Bolsonaro, Fernando Haddad e Geraldo Alckmin foram presenteados com estatuetas de ouro por ministros sauditas. Bolsonaro entregou o cavalinho (sem duas das pernas!) para não ser preso por peculato, Haddad acordou em tempo e devolveu sua oncinha à origem e Alckmin pretende seguir o exemplo e devolver o seu mimo. Os aliados e ministros de Lula nos devem explicações pela demora, pois todo mundo sentiu o odor de coisa suja. Bem, nem todos, Alckmin tem desculpa: ele estava em dúvida se a escultura era de cavalo, como as de Bolsonaro. O ministro e vice presidente ganhou um camelo de ouro e no Brasil ninguém sabe se o camelo é equino, jeguino ou zebrino. Na dúvida, melhor devolver.

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Mural da História

Nos jardins do castelo, em algum lugar do passado: Carolina Pessoa, Vivian Braga (repórter do Canal 12 – faleceu cedo), Gil Rocha, Toninho Vaz, Fernando Rodrigues, Jorge Narozniak e, agachado, Paulo Rosa. Parece uma quadrilha mas é uma equipe de TV. 

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Horóscopo – Prof. Thimpor

Touro (21 abril/20 maio). Nervosismo e tristeza, motivados pela gripe, que já preocupava a dinastia de Buto, na corrente do quarto milênio. Como já disse em meu livro “Sexo & História Geral”, a matéria e o espírito sempre existiram, embora um não soubesse da existência do outro, pois moravam em regiões diferentes. Siga as minhas instruções e nunca assoe à mesa. O melhor, estando gripado, é não levar o nariz às reuniões, coquetéis, recepções, etc. Bom período para chamar a atenção dos filhos, porém deixando as orelhas intactas. Osíris, no Alto Egito, nunca teria se tornado popular se a mãe lhe tivesse arrancado as orelhas na frente das visitas.

Vênus rege o ano de 2022, por ser o planeta mais próximo da Terra, ou seja, um vizinho que está a mais ou menos 42 milhões de quilômetros de distância, eliminando definitivamente o empréstimo do cortador de grama. Dos cinco planetas visíveis à olho nu, o mais luminoso é Vênus, dando a impressão de uma Las Vegas, sem texanos, porém com muito mais discos voadores estacionados.

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Paulo Jacinto (Alagoas)

ricocampocavaloroupas-580x326© Ricardo Silva

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PF prende hacker da Vaza Jato e faz buscas em endereços de Zambelli

Pagamentos desencadearam investigação; deputada bolsonarista pediu a Walter Delgatti que tentasse fraudar as urnas e o email de Alexandre de Moraes

A Polícia Federal prendeu o hacker da Vaza Jato, Walter Delgatti Neto (foto), e realizou busca e apreensão em endereços da deputada Carla Zambelli (PL-SP; foto) na manhã desta quarta-feira (2), no âmbito de investigação sobre tentativa fracassada de fraude nas eleições de 2022.

Ao todo, a polícia divulgou um mandado de prisão preventiva, o contra o hacker, e cinco mandados de busca e apreensão, três em Brasília e dois em São Paulo.

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou a operação com base em evidências de pagamentos feitos pelo gabinete de Zambelli ao próprio Delgatti. A PF ainda não divulgou o valor dos repasses.

A deputada pediu ao hacker que tentasse fraudar as urnas e invadir o email de Moraes, segundo depoimento à PF. O pedido teria ocorrido em setembro de 2022, durante encontro na Rodovia dos Bandeirantes, em São Paulo.

O hacker não conseguiu cumprir nenhuma das missões. Ele apenas falsificou um mandado de prisão contra Moraes no sistema do Conselho Nacional de Justiça.

Zambelli nega a versão dada por Delgatti, mas ela reconhece que o levou a reuniões em Brasília. Segundo a deputada, o objetivo seria montar uma equipe para fiscalizar as urnas.

O hacker chegou a se encontrar com Jair Bolsonaro no Palácio do Alvorada e com o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, na sede do partido.

“Em prosseguimento às ações em defesa da Constituição e da ordem jurídica, a Polícia Federal está cumprindo mandados judiciais relativos a invasões ou tentativas de invasões de sistemas informatizados do Poder Judiciário da União, no contexto dos ataques às instituições”, tuitou o ministro da Justiça, Flávio Dino, nesta quarta.

O esquema de Zambelli e Delgatti compõe o inquérito dos atos antidemocráticos e da insurreição de 8 de janeiro.

Delgatti já havia sido preso em julho de 2019, durante a Operação Spoofing, no contexto da Vaza Jato, por invadir perfis no Telegram e vazar mensagens de procuradores da Lava Jato. Ele também foi preso há menos de dois meses, em junho de 2023, por descumprimento de medidas judiciais.

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Pra não esquecer

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Mural da História – Lava Jato

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Cupido

William A. Bouguereau, La Rochelle, 30 de novembro de 1825, La Rochelle, 19 de agosto de 1905.

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Hoje, quarta, 2 de agosto. Dia de passar por cima das jamaicanas (desculpa aí o pessoal do reggae).

Renato sobreviveu

O eleitor do Renato Freitas não morre de tédio. Desde que ele assumiu o mandato de vereador, já foi preso, cassado, voltou ao mandato, chegou à Assembleia, comprou briga com um deputado bolsonarista barra pesada e foi denunciado de novo a um Conselho de Ética.

Hoje a notícia é que ele escapou de mais uma bala. O novo caso contra ele foi arquivado pelo Conselho de Ética da Assembleia – em boa medida porque ele teve a sorte de pegar Tercílio Turini (um dos poucos homens justos no plenário) como relator. As denúncias contra o ultrabolsonarista Ricardo Arruda tiveram o mesmo destino.

Isso não quer dizer que o tédio tenha enfim chegado à vida de Renato. A direita raivosa continua de olho nele e, na primeira oportunidade, o enredo começa tudo de novo.

Aqui!

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© Joel Peter Witkin. Sacred heart

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Quem mandou ser mulher?

Um clássico da misoginia nossa de cada dia, uma das variações que ajuda a definir a cultura do estupro

Há muitas perguntas sobre o roteiro de horror do estupro de uma mulher em completo estado de vulnerabilidade, em Belo Horizonte. Por que os amigos com quem assistia a um show deixaram que ela fosse embora sozinha diante do seu estado de embriaguez? Como o motorista de aplicativo abandona uma mulher desacordada numa calçada durante a madrugada? O que passa na cabeça de um homem, capaz de carregá-la inconsciente por três quilômetros para estuprá-la?

No entanto, uma pergunta que reverbera nas redes desde que o crime virou notícia é “quem mandou beber?”. Um clássico da misoginia nossa de cada dia, uma das variações que tão bem ajuda a definir a cultura do estupro. Por que estava com essa roupa? Isso é jeito de se comportar? Por que a família não fez nada? Sabemos que tudo se traduz numa questão mais simples: quem mandou ser mulher?

A reação desprovida de empatia nas redes nos traz ao menos a resposta de por que o Brasil se transformou na sociedade do estupro, na qual a violência é relevada e as vítimas seguem desprotegidas.

Também serve para entendermos por que os índices revelados no Anuário Brasileiro de Segurança Pública batem recorde no país, onde um caso é registrado a cada sete minutos.

No imaginário coletivo, a figura da mulher bêbada, seminua, sozinha, se divertindo é a resposta para tantos casos de violência sexual. Quem mandou ser mulher, não é mesmo? Mas o que este pensamento revela é mais do que cumplicidade. Parte dessas pessoas seria capaz de fazer o mesmo, estuprar uma mulher desprotegida ou ser conivente na omissão de socorro, porque enxerga na vítima a razão da sua própria agressão.

É parte da sociedade que ignora as estatísticas de que crianças e adolescentes são alvo preferencial de estupradores, que se aproveitam da vulnerabilidade daqueles que não sabem ou não conseguem se defender, exatamente como a mulher violentada no campo de futebol.

Publicado em Mariliz Pereira Jorge - Folha de São Paulo | Deixar um comentário
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Que país foi este?

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Os ouvidos são as janelas da alma.

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Ponto final

Eles estão sempre discutindo e decidindo a minha vida — a portas fechadas, na mesa de um café, na rodada de cerveja, no escuro do quarto. Não consigo acompanhar as andanças desses que discutem e decidem minha vida. Às vezes é pouca coisa — se ele mudasse o penteado… Se parasse de usar roupas de jovens… Se fosse consultar uma sortista… A essas coisas até que não dou muita importância — e isso também é motivo de discussão entre eles: se ele desse mais importância às pequenas coisas desse tipo… Muitas vezes nem fico sabendo o que foi discutido e decidido.

Só colho olhares atravessados, sorrisos forçados, gestos dissimulados e indiferença. A massacrante indiferença! E sinais — sim, sinais! Eles fazem questão de me dizer você não prestou atenção aos sinais que enviamos. Sinais — um dia sem palavras, um trancar de porta, a falta de convite para a festa, a roupa íntima nova, a demora para atender ao telefonema. Benditos e silenciosos sinais! O ar fica pesado e frio. Quando o assunto é mais sério, envolve decisões drásticas e exige imediata tomada de decisão — e ação — me chamam — sem palavras, só com gestos — a uma sala preparada para o momento. Até jarra de água e copos estão à espera. Nem precisariam falar nada, dar ordens ou fazer a acusação final. O aparato já me faz ver que fui condenado e terei de cumprir a pena. Pode ser demissão, rebaixamento de cargo, fim de uma relação amorosa ou cessação de algum benefício por eles concedido anteriormente. Já conheço o teor da peroração — é sempre para o meu bem — os desejos explícitos — boa sorte, tudo vai se ajeitar. Fique bem! Nem as palavras eles conseguem mudar. E nem precisariam — seria muito esforço para o mesmo final.

Decoraram tão bem as expressões que — acreditam — com elas obtêm expressivo resultado em qualquer situação. Faz parte da estratégia deles serem sempre iguais — surte efeito, alivia a consciência. Tinha que ser assim — eis o fim. E sabem que isso vai me fazer ferver por dentro, sem ter como reagir. O sangue que some do rosto, os olhos que se perdem no vazio, o frio que se instala no estômago, as pernas que fraquejam. Talvez riam disso depois. A única questão que nunca abordam é quanto ao andamento das suas próprias vidas depois do que fazem com a minha vida. Parecem soberanos quanto a isso. Têm olhos firmes no futuro, objetivos sólidos e vontade férrea.

Nunca tentei argumentar a esse respeito. Aferrei-me a um antigo preceito — tão antigo como o próprio mundo — e me dou por feliz. Hesíodo disse e está dito — os deuses são caprichosos. Ponto final.

*Rui Werneck de Capistrano escreve errado por linhas tortas

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