Você conhece a Família Thimpor?

Yuri Thimpor de Souza – O playboy da família. Causa furor na cidade quando resolve desfilar de biga, completamente embriagado. A fortuna dos Thimpor está nas mãos de Yuri, cujo anel está está avaliado em mais de setecentos mil dólares. Nasceu na Rússia, tornou-se mau caráter em Portugal e é preso constantemente em Milão. Apaixonou-se pela filha do fabricante de linguiça calabresa aos 18 anos. Aos 19 desistiu do romance depois de receber três tiros no braço e uma carta ameaçadora dos Trintino, que afirmavam ter conhecimento de Yuri com a Máfia e com o açougueiro Tosco.

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© Patrícia Basquiat

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Orlando Pedroso, do livro “Gordinhas”.

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Dez grandes frases da História

“Isso está mais parecido com uma ação de despejo que um golpe de Estado. Só falta aparecer o oficial de justiça”.(Getúlio Vargas, 29 de outubro de 1945, logo após os generais Cordeiro de Farias e Góis Monteiro mandarem cortar a luz, a água e o gás do Palácio Guanabara)

“Infeliz é o país que precisa de heróis”. (Bertolt Brecht – A vida de Galileu)

“Abandonei a Faculdade de Direito no segundo ano. Descobri que as causas que davam dinheiro não me interessavam e as que me interessavam não davam dinheiro”. (Carlos Lacerda)

“Das coisas menos importantes da vida, a mais importante é o futebol”. (Eduardo Galeano)

“Ninguém me ama. Ninguém me quer. Ninguém me chama de Baudelaire”. (Antônio Maria)

“De onde menos se espera é que não sai nada mesmo”. (Aparício Torelly, o Barão de Itararé).

“Marx não era marxista. Freud não era freudiano”. (Paulo Francis)

“Carlos, meu irmão, não se meta a fazer Hamlet. Não há espaço para fazer política como Shakespeare por aqui. O Brasil é o país da Dercy Gonçalves”. (Maurício Lacerda ao irmão Carlos, que queria fazer greve de fome na prisão depois da decretação do AI-5).

“Ser ou não ser, eis a questão”. (William Shakespeare – Hamlet).

“Vai prá puta que o pariu, seu filho da puta!”. (Dercy Gonçalves).

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© Jan Saudek

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Banho de sais

Vento quente no jardim da Casa de Água. Más valdría no haber nacido. Balofas nuvens: no undoso céu curvas imensas de cristal emanam dos eucaliptos e, se fumo erva-cidreira, me transmudo para um filme de Fellini, no exato instante daquele take de Amacord em que uma freira anã ajuda o louco de pedra a descer da árvore. Não sei se é o efeito do capim-cidreira, que clarifica e intensifica tudo a meu redor; também não sei se essas balofas nuvens algum dia existiram.

Para me distrair, enquanto Lucana se espreguiça na banheira, eu leio Arkadii Dragomoshenko na varanda da Casa de Água, sorvo ostras com limão, crustáceos com salsa e coentro. Eu lendo a ode em que Arkadii Dragomoshenko descreve o último suspiro de Oskar Kokoschka.

Depois abandono as odes, contemplo na banheira a respiração daquela que, após o banho de sais, vem espraiar-se ao vento.

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Vendo a série ‘Succession’ relembro um pouco como eram as Redações

Ambição, coisa maravilhosa que acorda e dorme comigo desde os meus sete anos

Fui forjada no finzinho da publicidade da década de 90 e no começo do jornalismo dos anos 2000. A gente trabalhava até muito tarde e, quando ouvia que um texto estava uma merda retumbante, voltava para a mesa e criava mais duzentas opções. E, caso levássemos tudo como ofensa pessoal (e fôssemos chorar no banheiro), outra pessoa faria antes –e melhor– de nós e perderíamos o emprego.

Eu me acostumei com um ambiente de piadas sem fim e ironia afiadíssima. Assistindo à série “Succession“, em que os irmãos o tempo todo cospem bullyings e comentários ácidos uns nos outros, relembro um pouco como eram as Redações. Por esse motivo, acompanhar os episódios me faz sentir uma espécie de “unheimlich” –termo freudiano para descrever o “estranho familiar”, algo que já conhecemos e, por isso mesmo, soa tão inquietante.

Já entendi que a geração que veio depois de mim (e, convenhamos, deu tempo de virem várias) é totalmente diferente. Já aceitei que eles estão certos e eu errada. E já admiti que teria sido melhor para a minha saúde mental se àquela época já existisse o tal compliance nas empresas e que metade da minha vida profissional –que horror!– foi corroborar com assédios morais e sexuais.

Dito isso tudo, fico sempre maravilhada com o que nós, pais e mães obcecados por apartamentos próprios, carros espaçosos e planos de saúde com Fleury para toda a família, criamos: filhos que cagam baldes para nossos brinquedinhos conquistados com doenças autoimunes. E filhos que não aguentam 10% das críticas que, tirando as perversas e escrotas, nos fizeram crescer.

Um tempo atrás, contratei um assistente de roteiro para me ajudar com um projeto. Comecei a segui-lo nas redes sociais e, em meio a uma dezena de vídeos sobre a importância do comunismo para o Brasil, vi que ele também estava tentando mobiliar todo o apartamento fazendo publi para eletrodomésticos. Dei um toque: “Amigo, ou você é comunista ou garoto propaganda da Brastemp”. Era para a gente ter rido. Ele me zoaria de volta. Brindaríamos com kombucha. Mas não. O rapaz pediu demissão. Aumentou a análise. Passou a me odiar. Deve espalhar por aí que sou tóxica, assediadora moral. Não sei mais lidar com as pessoas.

Os filhos privilegiados de alguns dos meus amigos são os que parecem mais felizes em dividir, com cinco ou mais amigos que eles nem conhecem direito, banheirinhos minúsculos com chuveiro elétrico capenga. E, pelo que entendi, essa parece ser uma meta de vida (para todo o sempre!).

Outro dia ouvi de uma mulher de 30 anos que ela não paga convênio médico para os pais idosos porque prolongar a vida de velhos, como fazem os bons hospitais, é uma coisa muito neoliberal e eles têm o direito de morrer. Essa geração acha que o carro é uma coisa absolutamente do mal (mas vejo pouca crítica à uberização de trabalhadores) e que, se der para viajar para algum lugar com bastante falta de conforto, toda a humildade vivida ali só ajuda a meditar.

Graças a Deus fui mãe velha. Rita ainda é praticamente um bebê. Talvez ela faça parte de uma geração “meio do caminho”: que saiba não ser explorada e não levar desaforo para casa, mas ao mesmo tempo tenha alguma ambição. Ambição, essa coisa maravilhosa que acorda e dorme comigo desde os meus sete anos de idade. Que me faz acreditar que às cinco da tarde ainda dá tempo de emplacar mais umas ideias em vez de largar a caneta para saudar o pôr do sol.

Não tem nada a ver com só pensar em dinheiro, mas tem muito a ver com não torrar tudo o que a geração anterior ganhou e ainda vir com o papinho de que não pensa em dinheiro.

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Escutem e não esqueçam: o golpe do dia 31, as cantoras e o poder do rádio

Nesta sexta-feira 31 de março, quando se completam 59 anos do golpe que durou 21 anos, o melhor é não esquecer e expiar a dor, ouvindo ao vivo o discurso de Jango Goulart na Central do Brasil anunciando as reformas de base – reformas agrária, tributária, eleitoral, além da nacionalização das refinarias, a regulamentação dos preços gerais e dos aluguéis.

Como ouvir o discurso que seria a sentença de morte do presidente desde 1961 ao incitar todos a “lutar com todas as forças” pela reforma? Um discurso que também foi numa sexta-feira, 13 de março de 1964, sem prever que dezoito dias depois, no fatídico 31 de março — ou talvez 1º de abril — os militares tomariam o poder frustrando políticos como Carlos Lacerda, o governador da Guanabara que não se conformou, como prova o áudio do jingle anunciando Lacerda para presidente em 1965.

Esses tesouros estão inseridos na exposição sobre “As Cantoras e a História do Rádio no Brasil”, entre 250 fotos, 114 objetos e recursos sonoros e audiovisuais. Nesse passeio pela linha do tempo que o rádio construiu no Brasil, principalmente entre as décadas de 1920 e 1960, está a história viva que todos os brasileiros, professores e alunos deveriam buscar até 25 de junho, no Farol Santander em São Paulo, rua João Brícola: o rádio como receptor da História.

Porque, emendando a fala de Getúlio, o áudio remete ao locutor anunciando que as tropas do II Exército, com o General Kruel à frente, já sitiaram o Estado da Guanabara, e que a presidência da República está vaga para ser ocupada pelo presidente da Câmara. Ranieri Mazzilli assume de fato no dia 2 de abril. Frustração: no dia seguinte, os militares desencadeiam a onda de prisões de líderes políticos, como o governador de Pernambuco Miguel Arraes, de dirigentes sindicais e camponeses, enquanto Jango se refugia no Uruguai. E no dia 9 de abril, a troica de militares que governa de fato o Brasil, composta pelo general Costa e Silva, o vice-almirante Augusto Rademaker e o Tenente-Brigadeiro Correia de Melo, decreta o Ato Institucional no 1º. Com uma anunciada eleição indireta para presidente da República em 1966, que nunca aconteceu, começa o circo de horrores que levaria à tortura, desaparecimento, sequestros e morte violenta de milhares de brasileiros.

Daí a importância dos registros radiofônicos que n’O Observatório da Imprensa, Alberto Dines explica em off, numa parede de destaque na exposição, num documentário que marcou os 90 anos das emissões no Brasil. Os primeiros ruídos, diz Dines, se ouvem a 7 de setembro de 1922, no discurso do presidente Epitácio Pessoa pelo centenário da independência. Dines explica que o governo não se interessou mais e começou a desmontar os espaços das emissoras. E quem moveu os pauzinhos para trazer o rádio de volta foi o antropólogo e médico Roquete Pinto, buscando adeptos até 1930. Foi quando a popularização do novo veículo de comunicação começou a acontecer.

A curadoria é da ex-secretária municipal de Cultura do Rio de Janeiro, Helena Severo, numa exposição que ainda resgata jingles para reeleição de Getúlio, o seu discurso em 1º de maio de 1940, os locutores anunciando a invasão da Polônia por Hitler e, em 1945, a morte do Führer. Além da incansável discussão sobre os rumos da democracia no país durante a votação do Parlamentarismo, sim ou não.

São históricos o anúncio de uma invenção infernal nas praias de Copacabana, o biquini; o prefixo do repórter Esso, por Heron Domingues; o velório nacional no Maracanã na derrota do Brasil para o Uruguai na Copa de 1950; os áudios do primeiro programa veiculado por A Voz do Brasil em 1935.

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Bárbara Kirchner, porque Curitiba é um Copo Vazio Cheio de Frio. © Maringas Maciel.

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Uma avenida para Jamil Snege

Lembro como se fosse hoje: perdidos pelas bocadas da Vila Centenário, tarde azul de outono, eu e Paulo Leminski, desgarrados da velha Grafipar, bêbados de um tonel, nos vimos de repente, o que não era incomum, caídos de amor por um desses botecos de subúrbio.

Misto de armazém e balcão de cachaça, – quem discordar há de? – aquilo ali, na tarde fria, era o paraíso. Depois de loas ao ócio e à vodka, não esqueço: o grande Pablo a olhar o chão de saibro à nossa frente, considerou sem esperanças que quando morrêssemos provavelmente ganharíamos o nome de uma daquelas ruelas.

E foi além, implacável na viagem “póstuma”: não passaríamos nunca de um desses vultos paranaenses que, mortos, levam o nome de uma saleta no prédio da Secretaria da Cultura ou da Biblioteca Pública. Mas o difícil mesmo aquele dia foi achar o ponto do ônibus de volta à cidade.

Paulo Leminski virou pedreira-show, graças ao pronto empenho de Jaime Lechinski, então assessor de Lerner, e amigo de fé do poeta. Toda vez que passo pela rua João Gava, o trânsito confuso, as multidões, a floresta de carros e a juventude aflita, recordo a tarde da Vila Centenário e sinto uma saudade assim doída do poeta-irmão, feito um secreto desespero.

E me vingo, profundamente me vingo, de que Leminski não seja uma perdida rua do Boqueirão nem uma saleta da Biblioteca Pública mas um dos espaços mais badalados da cidade. Uebas!

Dez de julho passado, outro poeta-irmão, este também compadre, um dos mais singulares escritores brasileiros, Jamil Snege, se vivo estivesse teria completado 69 anos! Iríamos gozar muito de sua cara. Velhote, hein? Ele que gozava, mordaz, todas as fragilidades…

Ano que vem, 70 anos de sua vida aérea, nas asas do vento! Convertido agora em palavras-poemas, palavras com asas, palavras-navalha, o texto cirúrgico e único, a língua um só saudável e sagaz vilipêndio.

Embora os inúmeros amigos em várias instâncias do poder, nem uma ruela no Boqueirão para celebrar o Turco. Jardinete, me disseram, esses dias… Jamil Snege é nome de um jardinete, acho que em Colombo, ou no Xaxim. É possível um negócio desses? Tudo é possível em se tratando de Snege, inclusive o esquecimento em que cai dolorosamente o ouro literário que nos legou…

Snege não pode ser nome de jardinete, senhores da vereança, senhores da prefeitura, senhores donos do provisório poder! Jamil Snege é bem mais que uma avenida! Que tal algum largo trecho, de muitas pistas, da Linha Verde? Beto Richa, esta é contigo. E não abrimos.Estava certo o Leminski: o paraíso é mesmo um perdido boteco da Vila Centenário.

2008

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Segurança no topo da agenda

Não acredito no fim do tráfico de drogas. Mas creio que chegou o momento de uma política nacional mais articulada. O Rio é uma cidade parcialmente ocupada pelo crime. Isso acontece há tanto tempo que às vezes se transforma num fato natural. Não se percebe a evolução do problema, muito menos sua tendência a se espalhar pelo país.

Tive a oportunidade de mostrar como o Nordeste está vivendo um processo semelhante. Fiz documentários em algumas de suas capitais. O caso que me pareceu mais grave, na época, foi o Ceará.

As coisas não aconteceram de forma espontânea. Passa pela região uma nova rota do tráfico de cocaína, vinda de Colômbia e Bolívia e, ao que tudo indica, seguindo para Cabo Verde, de onde se irradia para outros pontos do mundo.

As grandes facções do Sudeste se instalaram lá. Como a droga é abundante, houve espaço também para organizações locais, tanto no Norte (Família do Norte) como no Ceará (Defensores do Estado) e no Rio Grande do Norte (Sindicato).

Fui me aproximando do tema por causa da cobertura das chacinas em presídios. As organizações, de vez em quando, tentam se aniquilar, atrás das grades. O resultado foi o crescimento da violência nas capitais nordestinas e também o domínio territorial, como na periferia de Fortaleza.

A resposta do governo foi a criação de um centro integrado de inteligência, também em Fortaleza, com policiais dos nove estados. Mas essa inteligência falhou no Rio Grande do Norte. Os ataques que atingiram mais de 50 cidades talvez fossem previsíveis. Relatórios mostravam a existência de tortura nos presídios, comida estragada e agressões gratuitas aos presos.

Não acredito no fim do tráfico de drogas. Mas creio que chegou o momento de uma política nacional mais articulada. O plano do atentado contra Sergio Moro revela um nível de sofisticação que não me surpreende. Conheci o líder do PCC numa audiência da Câmara. Ao me ver, disse que tinha lido alguns livros meus. Pareceu-me mais inteligente do que a maioria dos deputados que o interrogavam.

O governo Bolsonaro e o próprio Moro não tinham uma política adequada para enfrentar o problema. Ela é muito baseada na violência e no aumento de penas. No meu entender, embora não se possa acabar com o tráfico, é possível desejar que não ocupe território e abandone suas ações violentas. Destaco quatro variáveis: inteligência, ação coordenada, direitos humanos e obras sociais.

A inteligência não resolve tudo, mas facilita quase tudo. Investir nela significa dar um grande passo. Sei que a expressão direitos humanos causa arrepios em muita gente. Mas são sensíveis ao argumento econômico. Qual a vantagem de fornecer comida estragada, provavelmente a bom preço? Isso leva a motins, fechamento do comércio, interrupção das aulas, destruição de prédios públicos e veículos, deslocamento aéreo da Força Nacional, com a despesa das diárias.

No final das contas, o ministro Flávio Dino anunciou um investimento de R$ 100 milhões no Rio Grande do Norte. Com inteligência e respeito aos direitos humanos, talvez fosse possível conseguir mais, gastando menos.

Outro dia entrevistei uma autoridade que atribui a violência do tráfico ao fato de a polícia ser eficaz. Embora não seja um especialista, contesto essa tese. O tráfico considera a eficácia policial como uma parte do jogo. Sua reação é aumentar a própria eficácia. Grande parte dos conflitos nasce de problemas nas penitenciárias. Não é preciso resolvê-los com minha fórmula, mas admiti-los, pelo menos, seria um passo adiante.

Como respeitar os presos e, simultaneamente, impedir que controlem o movimento da cadeia? Essa é uma questão que para mim se resolve também com inteligência e tecnologia. Tem se mostrado impossível controlar a entrada de celulares. Por que não controlar as chamadas que saem de lá? Talvez seja mais fácil e produtivo. Há sempre o problema da privacidade dos vizinhos que também usam telefones. Mas grande parte das penitenciárias não tem vizinhos.

Não tenho nenhuma pretensão de deter a verdade. Apenas torço por um debate nacional e pela libertação do nosso território

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Todo dia é dia

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Adrenalina

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Temos mas tamos em falta

Outro dia me dei conta de que estava sem critério. Nem lembro pra quê precisava, mas não tinha. Depois de revistar minuciosamente a mim mesmo, procurei pela casa inteira. Nada de critério. Claro, na falta dele, a busca é feita de forma não criteriosa.

O jeito foi sair para me abastecer, lá fora eu acharia. Afinal, critério é o alicerce da civilização. Ou é o telhado da sociedade? Talvez o corrimão da vida. Vê como não ter critério afeta a visão das coisas?

O mais prático é o comércio, que tem critério de moda, de utilidade, de funcionalidade. Entrei numa lojinha de R$1,99 e logo constatei: se não têm qualidade, vão ter algum critério? Percorri algumas vitrines e desanimei: não há critério à vista.

Na banca da esquina, folheei jornais e revistas. Triste. Pelas manchetes e textos, percebe-se que a maioria dos veículos já não tem nenhum critério. Por tabela, descartei a internet.

Quem sabe orientação profissional? Com médicos e advogados tive que considerar uma segunda, terceira, até quarta opinião, todas desprovidas do critério que eu queria.

Depois de me desiludir com artistas e intelectuais, que há muito também necessitam de critérios, arrisquei encanadores, eletricistas, pintores, e eles dizem que a ferramenta não funciona. Até cogitei de consultar políticos mas desisti – a última campanha eleitoral mostrou preocupante ausência de critérios.

Restava recorrer à sabedoria de pensadores e filósofos, educadores e até de formadores de opinião. Prestei atenção nos talks-shows onde se prestam à participação e acabei por concluir o inesperado: que eu sem critério me guio melhor que eles com o deles.

Ainda havia muito que cavocar atrás de critério, o dia findava, a necessidade aumentara. Porém, sem ele, não se tem a noção certa de onde ir, do que fazer, qual interjeição usar. Diacho!

Como o prazo para entregar o texto se esgotara, ele ficou assim mesmo, descriteriado. Ou descriterizado? Se o leitor julgar este conteúdo criteriosamente, bom sinal. Algum critério ainda resta no mundo.

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eu e um idiota conhecido
fomos a um parque de diversões
eu fiquei com a mulher gorila
ele com dois tesões

outro dia fomos numa festa
das de encher de carro o quarteirão
enquanto ele agarrava uma ninfeta
eu ia embora de a pezão

esse meu amigo é um cara gostoso
e além de tudo ainda é bonitão
como é que eu faço com essa cara de bozo
pra concorrer com esse bernardão

meu amigo diz: eu tenho sorte
e eu digo que não sou nem azarão
ele com um mignon no camarote
e eu com os toucinhos no salão

marcos prado

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