Fraga

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O apito

Tudo o que o Mafra dizia, o Dubin duvidava. Eram inseparáveis, mas viviam brigando. Porque o Mafra contava histórias fantásticas e o Dubin sempre fazia aquela cara de conta outra.
— Uma vez…
— Lá vem história.
— Eu nem comecei e você já está duvidando?
— Duvidando, não. Não acredito mesmo.
— Mas eu nem contei ainda!
— Então conta.
— Uma vez eu fui a um baile só de pernetas e…
— Eu não disse? Eu não disse?
O Mafra às vezes fazia questão de provar as suas histórias para o Dubin.
— Dubin, eu sou ou não sou pai-de-santo honorário?
O Dubin relutava, mas confirmava.
— É.
Mas em seguida arrematava:
— Também, aquele terreiro está aceitando até turista argentino…
Então veio o caso do apito. Um dia, numa roda, assim no mais , o Mafra revelou:
— Tenho um apito de chamar mulher.
— O quê?
— Um apito de chamar mulher.
Ninguém acreditou. O Dubin chegou a bater com a cabeça na mesa, gemendo:
— Ai meu Deus! Ai meu Deus!
— Não quer acreditar, não acredita. Mas tenho.
— Então mostra.
— Não está aqui. E aqui não precisa apito. É só dizer “vem cá”.
O Dubin gesticulava para o céu, apelando por justiça.
— Um apito de chamar mulher! Só faltava essa!

Mas aconteceu o seguinte: Mafra e Dubin foram juntos numa viagem (Mafra queria provar ao Dubin que tinha mesmo terras na Amazônia, uma ilha que mudava de lugar conforme as cheias) e o avião caiu em plena selva. Ninguém se pisou, todos sobreviveram e depois de uma semana a frutas e água foram salvos pela FAB. Na volta, cercados pelos amigos, Mafra e Dubin contaram sua aventura. E Mafra, triunfante, pediu para Dubin:
— Agora conta do meu apito.
— Conta você — disse Dubin, contrafeito.
— O apito existia ou não existia?
— Existia.
— Conta, conta — pediram os outros.— Foi no quarto ou quinto dia. Já sabíamos que ninguém morreria. A FAB já tinha nos localizado. O salvamento era só uma questão de tempo. Então, naquela descontração geral, tirei o meu apito do bolso.
— O tal de chamar mulher?
— Exato. Estou mentindo, Dubinzinho?
— Não — murmurou Dubinzinho.
— Soprei o apito e pimba.
— Apareceram mulheres?
— Coisa de dez minutos. Três mulheres.
Todos se viraram para o Dubin incrédulos.
— É verdade?
— É — concedeu Dubin.
Fez-se um silêncio de puro espanto. No fim do qual Dubin falou outra vez:
— Mas também, era cada bucho!

(O Apito é um clássico de Luis Fernando Verissimo. Foi publicado originalmente em coluna nos jornais e faz parte da coletânea Outras do Analista de Bagé/1982. Vive em Porto Alegre, é jornalista, escritor, humorista, cartunista e quadrinista) 

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Rua do Alecrim

Eça-de-QueirosCaro Solda, na Rua do Alecrim, do lado esquerdo de quem a sobe, pertinho da Praça Camões e de “A Brazileira” – onde há uma escultura do Fernando Pessoa, sentado e com uma cadeira vaga ao lado para os turistas posarem ao lado dela – encontro o Eça de Queirós com uma mulher semidespida (ou semivestida) na sua frente (esculturas, convém dizer). É a personificação da nudez. E, em baixo, a reprodução da epígrafe de “A Relíquia”: “Sobre a nudez forte da verdade o manto diaphano da phantasia.” 

Dizem que uma vez voltando da França, na fronteira espanhola ele teria dito: Ah! a barbárie! A Europa terminava nos Pirineus, dali em diante começava a barbárie. Bem, ia dizer outra coisa, mas é melhor ficar de boca calada. Dico Kremer

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Radiocaos

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Coração de Aladim

a cidade mastiga meu peito
quero gritar
sonho comigo mesmo
afônico

você que me dói
e põe dentes nos edifícios

seu olho me olha por dentro
como uma estrela cheia de mágoa
transborda sua luz
sem soluço

quieto como um copo cheio
no parapeito da janela
ao vento

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Faça propaganda e não reclame

beto-cuba-DSC02135Praia de Trinidad. Em Cuba, como os cubanos.  © Beto Bruel

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Disha Yudina. © Zishy

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O marreco não é kosher

Pra mim ainda tem muito ovo debaixo desse marreco” – post cabalístico da judia pernambucana Gigi Pedrosa na página Judeus Contra o Fascismo.

Pelo que entendo de judeus, esse marreco não é kosher. Kosher, cachér em judeu brasileiro, é o modo religioso de cozinhar, tirando a impureza dos alimentos.

Pelo que entendo de Gigi, é veneno letal.

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Ditados populares, ou dilares poputados

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Os livros do Prof. Thimpor

A Máquina Descalça, de J. Forbes; EditoraPriori; 226 páginas frente e verso; 226 cruzeiros (1 por página); capa grátis.

Uma holandesa é raptada por seres extraterrestres e levada ao planeta 662 – ramal 23, onde permanece 132 anos como prisioneira das potentes máquinas pensantes que habitam o misterioso corpo celeste, do tamanho de uma laranja sem sementes. Como prisioneira dos estranhos seres, a holandesa não diz uma só palavra e, até que as máquinas cheguem à uma conclusão, permanece sentada sobre um exemplar da revista “GutGut”, distribuída nos banheiros públicos de Londres.

Quando finalmente resolve abrir a boca e dizer algo, uma das máquinas, semelhante à uma lavadora automática cheia de roupas sujas, lhe desfere um pontapé no traseiro, ato imediatamente revidado pela holandesa, que fica com o pé inchado durante o resto de sua permanência naquele planeta. Devolvida à Terra, ela é encontrada por um povo extremamente desenvolvido, recebendo sessões diárias de acupuntura até que, lendo o jornal de domingo, encontra um emprego de peneira e foge de tudo.

A narrativa forte de J. Forbes evoca Isac Asimov da fase azul, com exceção da parte em que a holandesa sobe as escadas em direção ao WC da Diretoria. Para os leitores da moderna ficção científica com problemas no trato urogenital, um livro perfeito.

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Karamba!

Vai lá: Plural

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Crer pra ver

Assim como os fãs de Super-Homem, os bolsonaristas nunca se fazem perguntas sobre Bolsonaro

Numa palestra recente sobre qualquer assunto, falei em “suspension of disbelief” e me perguntaram o que queria dizer. Difícil de traduzir. “Suspensão da descrença”? Tentei explicar: é como ignorar as evidências contra alguém ou alguma coisa e continuar acreditando nele ou nela. Para simplificar, dei um exemplo: a saga do Super-Homem.

Como até as pedras sabem, Super-Homem nasceu em Kripton, planeta que explodiu devido a uma reação em cadeia. Seus pais mandaram o bebê para a Terra numa nave espacial, um minuto antes da explosão. Certo. Supondo que Kal-El, nome do garoto, fosse amamentado durante a viagem por um peito automático, quem lhe trocava as fraldas quando ele fazia xixi? Quem lhe aplicava talco às virilhas assadas? Quem o ajudava a dar aquele arrotinho?

Super-Homem é o Homem de Aço, lembra-se? Em adolescente, ao dançar cheek to cheek com a namoradinha num baile, como fazia para disfarçar suas ereções, sendo estas também de aço? Com dentes idem, de aço, como o dentista conseguia tratá-lo? E, já adulto, em sua vida civil como Clark Kent, bastava-lhe usar óculos para disfarçar sua identidade. Como era quando os tirava para limpá-los na presença de sua colega, a arguta repórter Lois Lane?

Clark tinha às vezes de entrar numa cabine telefônica para trocar de roupa e se transformar em Super-Homem. Como tirar o chapéu, terno, camisa, gravata, sapatos e meias em tão diminuto espaço e em alta velocidade? E onde guardá-los? Dizem que dobrados num bolso interno da capa. Mas não estariam terrivelmente amarrotados quando ele os vestisse ao voltar para seu emprego no jornal Planeta Diário?

Sim, são perguntas de espírito de porco, que os devotos de Super-Homem nunca se fariam. Tal e qual os zumbis de Jair Bolsonaro, que, contra todas as evidências, vivem numa cega “suspension of disbelief” sobre as atrocidades de seu mito. É crer para ver.

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Olho suas mãos

Marianna Camargo

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