Transfobia no MEC

Visão do titular da pasta sobre o mundo é obscurantista e sombria

O pastor que ocupa o Ministério da Educação, Milton Ribeiro, pouco fala, mas quando abre a boca sempre provoca estupefação pela capacidade de expressar uma visão de mundo tão obscurantista e sombria.

Seu palavrório incita a discriminação, a hostilidade e a violência contra a população LGBTQIA+. Sendo titular do MEC, tudo o que fala, faz ou deixa de fazer reverbera no tecido social, tem consequências concretas. Por isso, o ministro precisa ser responsabilizado.

A Procuradoria-Geral da República já o denunciou por homofobia porque, em entrevista, ele afirmou que jovens homossexuais são de “famílias desajustadas”. Cabe ao STF aceitar ou não a denúncia para que ele se torne réu. Vale lembrar que, em 2019, a corte decidiu equiparar condutas homofóbicas e transfóbicas ao crime de racismo.

Pois bem, dias atrás, Ribeiro saiu-se com outra. Disse que não vai permitir que escolas ensinem “coisa errada” para crianças; que “não tem esse negócio de ensinar ‘você nasceu homem, pode ser mulher'”. A fala é carregada de transfobia. O ministro da deseducação desconhece que orientação sexual e identidade de gênero são a dimensão primordial da existência. Saber quem somos é tão essencial quanto o ar que respiramos.

Mas exigir tal compreensão é pedir demais para alguém que tem fixação na violência como método pedagógico. No púlpito de uma igreja, em 2016, Ribeiro preconizou a “vara da disciplina” para corrigir o comportamento das crianças. “Há uma inclinação na vida da criança para o pecado, para a coisa errada”, delirou.

Já ministro, o sujeito disse ainda que crianças portadoras de deficiência “atrapalham” o aprendizado de outras e que “é impossível a convivência” entre elas. Ribeiro soa como um Torquemada deslocado no século 21. Também não faria feio no gabinete de Hitler, com seu discurso de filiação eugenista, propagador da segregação social que sabemos onde termina: em ódio, sofrimento e morte.

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Charles Gates Sheldon – Portrait of the silent film star Dolores Costello|1920

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© Jan Saudek

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Portfólio

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Enéas Lour, Lejambre (caingangue), em algum lugar do passado. © Lina Faria (txucarramãe e txucarravó)

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Anabelarella. © IShotMySelf

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Mural da História

Por Obama, jornal demite cartunista

O Estado do Paraná demitiu o cartunista Luiz Solda. Ele fez uma charge mostrando um macaco dando banana ao presidente dos EUA, Barack Obama. Estou entre aqueles que degustam as charges, mas é claro que o defenderia também se as detestasse. A censura é um ato execrável, predatório e inútil. Foi um erro do jornal demitir o cartunista. Crime de opinião e de expressão, como nos velhos e atormentados tempos da ditadura militar.

Fiz minha dissertação de mestrado – quatro anos de trabalho, na UFRGS, em Porto Alegre – e a de doutorado, mais seis anos, ambas sobre a censura, na USP, em São Paulo. Sei do que falo. As duas teses viraram livros. A proibição é tiro na culatra: prejudica os editores e os leitores. A História dá a volta por cima e Luiz Solda terá doravante o seu retrato emoldurado por essa proibição. Ainda é tempo de os editores que o demitiram se arrependerem, voltarem a examinar o problema, descontar o calor da hora e readmiti-lo. Seria um gesto de grandeza.

Revirando no túmulo

Estreei como escritor em O Estado do Paraná, levado à redação pelas mãos do cineasta Sílvio Back. Os dois contos com os quais estreei na imprensa foram adaptados para a televisão com o talento de Antunes Filho, na TV Cultura, em São Paulo.

Preso por contos publicados num outro jornal, depois cumpri pena em liberdade condicional, incurso na Lei de Segurança Nacional e na Lei da Imprensa, que tantas vítimas fez entre jornalista, escritores, intelectuais e artistas, enfim sobre todos os que ousavam discordar e expressar suas discordâncias. Libertado, fui condenado a dois anos de prisão e passei a me apresentar periodicamente aos tribunais, nos termos da sursis. E nesse ínterim O Estado do Paraná publicava outros contos e textos meus, me entrevistava – era um sinal, uma força que fez com que uns poucos acusadores recuassem. Eu morava no Paraná naqueles anos.

Por tudo isso, por ter O Estado do Paraná como presença tão memorável em minha vida de escritor e professor, é que me entristeço com a demissão de Luiz Solda. Onde puder, farei chegar a minha voz e o meu pedido: que a demissão de Luiz Solda seja reconsiderada. Hoje sou escritor que tenho livros publicados em diversos países e em vários idiomas, com prêmios nacionais e internacionais, mas tudo começou com aqueles primeiros passos em O Estado do Paraná.

O jornalista e romancista Manoel Carlos Karam, diretor de redação de O Estado do Paraná por tantos anos e hoje nome de praça no Mercado Municipal em Curitiba, que nos deixou tão cedo, com cinquenta e poucos anos, lá do céu deve estar furioso com o que fizeram com o jornal que ele sempre soube defender tão bem.

Negão presidente

O tempora, o mores! Esperamos, como disse, que reconsiderem essa demissão antes que a repercussão não prejudique um jornal que faz por merecer o respeito dos leitores. Então que esse respeito seja mútuo e que ele não exclua de seus quadros um cartunista tão talentoso.

Se já o excluiu, que o reinclua, pois vivemos tempos de inclusão, como esse ora vivido pelos Estados Unidos, que dão uma referência solar ao mundo, elegendo um negro para a presidência da República.

Mas daí a não poder brincar com o tema é proibição que não podemos aceitar. Quer dizer que se eu registrasse o que, em recente reunião de escritores referenciais, dissemos e ouvimos, que Barack Obama é um “fabuloso negão”, seríamos vetados em O Estado do Paraná?

25|Março|2011

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Palíndromos do Fraga

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Faça propaganda e não reclame

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Barros e Becket

Em verdade vos digo, assino em público e raso, para ciência dos presentes e inconsequentes, que quem quer que estiver ao lado de Ricardo Barros, no partido, no palanque, na lista de doadores, até na mesa ao lado do restaurante, será por mim amaldiçoado e renegado. Não fará diferença para ninguém, mas para mim trará paz de espírito, descargo de consciência.

Ricardo Barros, homem de todos os presidentes e de nenhum brasileiro, é a mais apurada quintessência do político egocêntrico, autocentrado e solipsista que houve, há e haverá no Brasil, pois tudo o que faz nem de longe sugere o bem público. Outros fizeram pior, outros nos levarão ao abismo – entre eles Jair Bolsonaro. Mas nenhum teve ou terá a eficiência fria e incansável de Ricardo Barros.

No tropismo que o atrai ao poder, Barros serve antípodas: FHC, Lula, Dilma. Sempre no tempo presente e com igual fervor ao que dedica a Jair Bolsonaro. O pior não cabe no dicionário de Barros, que só traduz o útil. Tem sido o homem de todas as estações. Quando nada e para entender estas linhas podia ler sobre Thomas Becket, o homem que renegou o poder e morreu para não ser mais um “homem de todas as estações”.

A última de Barros, que como líder do governo, orienta a tramitação urgente da lei de mineração em terras indígenas. Quando o Brasil ficar assoreado, árido, os rios secos, Ricardo Barros estará no desfrute da sombra, da água fresca e da calça folgada, ainda líder, operoso, eficiente e orgânico do poder do momento. Um homem que converte seu tom de natural cinza na cor que replica a da meio que o abriga.

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#ForaBozo!

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Fraga

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Adeus a Orlando Brito, um dos fotógrafos mais importantes do país

Hoje o dia amanheceu mais triste para todos que fazemos Os Divergentes. Recebemos a notícia que nenhum de nós queria ouvir: nosso grande amigo Orlando Brito nos deixou na manhã dessa sexta-feira (11/03), depois de 34 dias lutando pela vida na UTI do Hospital Regional de Taguatinga, no Distrito Federal. Mais que um grande profissional, talvez o maior que o Brasil já teve na fotografia, perdemos um sócio, um amigo, um ser humano maravilhoso.

Nascido em Janaúba, Minas Gerais, no dia 8 de fevereiro de 1950, Brito chegou a Brasília ainda menino, no começo de 1957, durante a construção da nova capital. Seu trabalho abrange os temas da política e da economia, questões sociais, da vida urbana e do interior, terras, índios, esportes e, enfim, todos os assuntos.

Ao longo da sua extensa carreira como repórter fotográfico, viajou por mais de 60 países, em coberturas presidenciais, papais e esportivas. Daí surgiram verdadeiras obras de arte em forma de fotografias. Brito era um gênio, conseguia captar a alma das pessoas e enxergar além. Assim, foram registradas pelas suas lentes cenas icônicas da política, do esporte, do  cotidiano.

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Será que ele é?

Hoje torço para que o deputado que quis “caçar” uma mulher em situação de vulnerabilidade seja, ele sim, cassado

Eu lembro desse sujeito parado ao lado da minha mesa, em uma das agências de propaganda em que trabalhei, olhando para todas as mulheres do recinto e falando para um estagiário: “Aqui não tem condição”. O menino insistia: “A fulana do atendimento é bem bonita”. Ao que o redator respondia: “Morena demais”. O subalterno, querendo agradar, apontava a loiríssima da mídia: “E ela?”. O elemento balançava a cabeça: “O cabelo é pintado e a cara é ‘muito brasileira’, não tem jeito”.

Aquele rapaz que tinha lutado bravamente para ser alguém (tinha mesmo? Por que, na época, eu realmente achava que pensar piadas para vender bolacha e ganhar fortunas antes dos 30 anos era ser genial?). Que a gente chamava para as festas e para os almoços. Que fazia caretas e imitava pessoas, nos levando à gargalhada. Ele estava mesmo sendo… Será? E por que, meu Deus, a gente ainda falava com ele? Onde estava nosso caráter em 1999?

Você me pede que, por favor, tome muito cuidado com meu costume de usar “nazi” para xingar os outros. Diz que é perigoso. “Usa racista, Tati. Usa hétero top nojento. Sei lá”.

Você está certo. Mas, apesar da sua beleza, da sua inteligência e de os seus olhos serem um mar calmo que me causa tantas arrebentações no peito —e do quão absurdo é o fato de o mundo e este texto comportarem, ao mesmo tempo, o tipo de homem que você é e o tipo de homem que existe aos montes por aí —, eu vou sim chamar de nazistinha de merda esse indivíduo, parado na minha lembrança ao lado da minha mesa, disposto a, em plena luz do dia da virada do século, ir além de objetificar mulheres (como se isso não bastasse para que ele fosse o pior dos seres).

O que esse redator fazia, e eu na época não conseguia dar nome, era uma espécie de caçada pela raça ariana em agências e baladas paulistanas. E isso é, sim, racismo, sexismo, machismo, mas o “nazi” fica esperneando na minha boca. E a gente precisa, cada vez mais, nomear o que nos adoece.

Lembrei dessa história quando o deputado estadual Arthur do Val (ex-Podemos, ex-MBL e ex da namorada que lhe deu um merecidíssimo pé na bunda) narrou em áudios criminosos e repugnantes que a fila de refugiadas da Ucrânia é um ótimo lugar para “pegar deusas” e fazer o tal “tour de blonde”.

Isso existe mesmo. Eu conheci muitos publicitários que iam quase todo ano para o Leste Europeu atrás de mulheres que eles consideravam, pela raça e pela cor, superiores. E eles voltavam cheios de fotos. Exibiam para os estagiários (que sonhavam logo poder fazer o mesmo, e logo podiam). Postavam no Facebook.

Outros publicitários comentavam: “Que que é isso, man! Mandou bem!”. E o papo era exatamente esse do áudio do deputado: lá elas te dão bola porque são pobres!

Hoje torço para que esse deputado, que quis “caçar” uma mulher em situação de vulnerabilidade, seja, ele sim, cassado. E não possa mais se candidatar nem a ser humano.

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Além de não ter derretido, Bolsonaro é competitivo e pode vencer

Presidente é o primeiro direitista que consegue dar expressão popular à voz da reação porque fala aos simples

Chegamos a meados de março, e a candidatura de Jair Bolsonaro à reeleição não derreteu como muitos previam. Nunca apostei nessa possibilidade, como sabem os que me acompanham aqui e alhures. Ao contrário: escrevi, e mantenho a avaliação, que ele deve chegar competitivo ao segundo turno.

Subestimá-lo, ignorando a arena sanguinolenta das redes sociais em que também se trava a disputa, foi o erro mais tolo cometido em 2018. Por “competitivo”, entenda-se: o presidente pode ser reeleito.

Lula parece ter a mesma avaliação. Em encontro com lideranças femininas na manhã desta quinta (10), foi direto: “A luta não será fácil. Não existe essa do ‘já ganhou’. Eleição, a gente só sabe o resultado depois da apuração”.

A fala do petista apela ao risco real da derrota para justificar as alianças, inclusive com quem defendeu o impeachment. O provável vice na chapa, Geraldo Alckmin, foi escolhido antes que este definisse o partido em que vai ingressar.

Não é o PSB a indicar a disposição de Lula de fazer uma frente tão ampla quanto possível pela governabilidade, mas a própria figura do ex-governador de São Paulo, que não tem como se confundir com a caricatura de um radical. Se a empreitada der certo, ele não será um mero adorno no Palácio do Jaburu.

Lula nunca acreditou que Bolsonaro seria tragado ou pela ruindade do seu governo ou por vagas de opinião. Poucos políticos têm um ouvido aguçado como o seu para ouvir a voz das ruas —mesmo a das ruas virtuais de hoje em dia.

O petista deve ter percebido uma evidência sobre a qual a nossa sociologia até agora não se debruçou: a direita brasileira nunca deu à luz uma personagem com as características do atual presidente. Assim como a esquerda, antes, nunca tinha produzido um… Lula.

Em muitos aspectos, os embates ideológicos brasileiros, e assim foi até a redemocratização, eram um confronto de elites mais ou menos letradas. Lula foi o primeiro esquerdista brasileiro cuja linguagem era realmente compreendida pelo chamado “chão da fábrica”, como se dizia ao tempo em que emergiu como liderança. Não cabem aqui as minudências, mas o marxismo nativo das décadas de 70 e 80 torcia o nariz para ele e para o que considerava suas “simplificações”.

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