Doria derrota Bolsonaro

Depois de dizer ‘NÃO SERÁ COMPRADA’, Bolsonaro comprou 46 milhões doses da Coronavac

João Doria é valente. Em seu lugar, eu não teria entregado as vacinas contra Covid-19 ao governo federal antes de o cheque pela compra do biofármaco ter sido compensado. Para não dizer que Jair Bolsonaro e seus prepostos são um bando de salafrários, afirmo apenas que a confiabilidade do Planalto tende a zero.

Nem precisamos nos afastar da vacina para constatá-lo. Menos de três meses atrás, ao ser questionado por um apoiador sobre o anúncio de que o Ministério da Saúde iria adquirir a Coronavac sino-doriana, o presidente desautorizou seu ministro e escreveu no Facebook: “NÃO SERÁ COMPRADA”. Comprou, 46 milhões de doses, com opção de mais 54 milhões.

Obviamente, não me queixo de o presidente ter descumprido a palavra. Mas, se tivesse dignidade, ofereceria uma explicação para a mudança de atitude, além de um pedido de desculpas aos chineses e ao governador paulista.

Daí não decorre que o comportamento de Doria tenha sido exemplar. Na comparação com Bolsonaro, ele é um farol de iluminismo, mas isso não o impediu de envolver o Instituto Butantan num constrangedor espetáculo televisionado de “cherry picking”, desastroso para quem pretende fazer ciência a sério.

Devemos lamentar a politização da vacina, mas só até certo ponto. Se Bolsonaro e Doria não tivessem entrado numa irrefreada disputa pela foto da primeira agulhada, que o Bandeirantes venceu, o Planalto dificilmente teria se mexido, e estaríamos ainda mais atrasados na imunização.

Há, porém, um lado mais sombrio na politização da vacina. Existem discussões como a do aborto e a da legalização das drogas que, por envolver crenças filosóficas e valores, são quase que naturalmente politizadas. Mas há outras, como a mudança climática ou a vacinação, em que o espaço para o subjetivismo é menor. Quando elas se politizam, em geral é porque um dos lados se tornou imune às evidências, o que é sempre perigoso.

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Sessão da meia-noite no Bacacheri

cargo-200Na União Soviética da década de 1980, duas garotas voltam para casa de um baile  e desaparecem, entre elas a filha do presidente do comitê do Partido Comunista. Feita refém por um policial, a jovem posteriormente é abusada pelo homem da lei enlouquecido. 

Inspirado em um pequeno artigo de jornal, Mercadoria 200 é, provavelmente, o filme mais importante na carreira de Balabanov, que faz, aqui, uma autópsia do seu país. Tendo como fundo a guerra do Afeganistão, este thriller conta a história de um policial maníaco, sua mãe, um professor universitário ateu, o líder do partido local e sua filha desaparecida, entre outros habitantes da pequena cidade soviética de Leninsk.

Gruz 200, Mercadoria 200, direção de Alexeï Balabanov, 2007, Rússia.

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A história que vamos contar

Por tudo o que já foi dito e lido, o dia de ontem virou um marco histórico. A cena da primeira brasileira sendo vacinada contra a Covid-19 em território nacional, uma profissional da linha de frente do enfrentamento da pandemia, com todas as condições e comorbidades que a posicionam no topo da lista de pessoas prioritárias na fila de imunização, é carregada de simbolismos e ficará registrada em nossa memória cultural (ao menos a maioria das pessoas reconhecerá sua importância assim) como um retrato da esperança coletiva em vislumbrar um fim para esse sofrimento.

As feridas decorrentes dele, por outro lado, vão continuar a exigir mais cuidado e paciência de nossa parte, pois demorarão um pouco ainda para cicatrizarem. As oportunidades que se abriram em meio às tantas crises embutidas na pandemia do novo coronavírus tendem a se solidificar e a serem incorporadas no nosso dia a dia, frutos do autoconhecimento, de outros aprendizados e da superação. Desde as primeiras horas da manhã, aviões sobrevoam nossas cabeças e as imagens nos noticiários da TV, sobre a chegada e distribuição dos primeiros lotes nos estados, também transportam alívios e expectativas.

Se sobrevivemos à Covid-19 e estamos vivos até agora para registrar, contar a história desse tempo e apagar as suas luzes, só pode haver duas razões: somos do tipo “vaso ruim” ou portadores da responsabilidade e do compromisso de sairmos melhores disso tudo. Sem dar margem a ingenuidades, a grande mídia, no pior estilo da cerâmica, já se aproveita das euforias geradas e dos descontentamentos óbvios para se apressar em eleger um “salvador da pátria” que possa chamar de seu.

Mas, sabedores de tudo isso, cabe a nós assumirmos o papel de quem tirará um proveito mais nobre dessas lições e deseja que o legado de tamanhas privações e dores possa ser apenas e tão somente o resgate da nossa condição de humanidade. A concentração das doses de vacinação administradas nas regiões e países ricos do Globo, contra os baixos indicadores (nulos até) em países pobres, exibe um retrato triste de um mundo que teima em se constituir desigual. As desigualdades socioeconômicas persistem como os mais perversos fatores de risco para quaisquer pandemias ou catástrofes, sejam naturais ou provocadas, espontâneas, inesperadas ou previsíveis e induzidas.  

Que antes mesmo de nos imunizarmos e voltarmos ao estado de insensibilidade próprio do conforto e da ausência de dúvidas, a gente decifre a fórmula que apontará para um mínimo denominador comum de solidariedade e de empatia. E, como me ensinou uma amiga, engajada em movimentos populares: que essa matemática se dê não por mera generosidade, exercício de caridade de nossa parte, mas guiados pela ética e pelo princípio da igualdade na garantia de direitos. Ou fazemos isso ou continuaremos nos equilibrando nas bordas de um planeta achatado. Não é a história que quero contar de cabeça erguida e com a consciência tranquila para quem virá, na sequência, carregar e definir os significados do estandarte do que entendemos por civilização.

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Felizes com a pandemia, sequelados com a vacina

Se Jair Bolsonaro desapareceu, Pazuello já apresentou sintomas completamente distintos. O general especialista em logística, que a Advocacia-Geral da União notificou ter sabido da falta de oxigênio em Manaus com 10 dias de antecedência, apareceu subitamente de ombreiras, peito inflado e falando grosso

Procura-se o presidente da República, Jair Bolsonaro. O pouco excelentíssimo senhor chefe de estado do Brasil está completamente sumido, mudo, catatônico, sem sinal da internet e sem sinais vitais públicos desde o exato instante em que o governador de São Paulo, João Doria, deu início à vacinação dos voluntários paulistas com a Coronavac, imediatamente após a aprovação da Anvisa. 

Durante a transmissão do parecer técnico da agência de vigilância sanitária, que aprovou o uso emergencial das vacinas do Butantan e da Fiocruz, foi incensada a necessidade de monitorar eventuais reações adversas que pudessem acontecer aos vacinados, embora sem nenhuma evidência contundente. Nenhum profissional da instituição, no entanto, alertou para a ocorrência de efeitos colaterais esquisitos e potencialmente graves das vacinas em autoridades máximas do país.

Enquanto não havia vacina, Jair Bolsonaro estava perfeitamente saudável, ativo, falante, passeando de jet-ski, lancha, nadando em mar aberto, fazendo aglomerações sem máscaras, integrando carreatas pelo país e realizando turnês de cloroquina pelo Brasil. Desde a recusa das emas, Jair não parecia tão afetado. Esquisitíssimo. 

Sobretudo, porque presidente e o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, são dois ferrenhos defensores do combate à Covid-19 com a alegria. “Quem é feliz não pega Covid”, é o lema dos comandantes do país que já soma mais de 8 milhões de infectados ‒ número, inclusive, que inclui a dupla. Deve ter faltado felicidade ali em algum momento. Mas, primeiro, a alegria; depois, a cloroquina. A chegada da vacina parece não ter feito bem à alegria e à cloroquina de ambos. 

Se Jair Bolsonaro desapareceu, Pazuello já apresentou sintomas completamente distintos. O general especialista em logística, que a Advocacia-Geral da União notificou ter sabido da falta de oxigênio em Manaus com 10 dias de antecedência, apareceu subitamente de ombreiras, peito inflado e falando grosso. 

Os efeitos colaterais mais evidentes no ministro da Saúde foram a raiva e a confusão mental. Em um discurso de lógica prejudicada e tom agressivo, Pazuello espumava palavras em um delírio de quartel, ao mesmo tempo em que manifestava o terceiro sintoma adverso: o de especialista em logística jornalística. Não havia pergunta de repórter que o ministro militar não pudesse consertar, aprimorar, orientar a melhor técnica, qual um professor universitário.

Se por um acaso do destino o ministro da Saúde porventura deixar o cargo por algum motivo, sabe-se lá qual ‒ apenas uma hipótese remota, imagina ‒, o trabalhador brasileiro que dá vida ao mascote “Canarinho Pistola”, da Seleção Brasileira de Butebol, que ponha as barbas de molho. Poucas vezes uma atuação enfurecida convenceu tanto crítica e público. Memorável. 

Pazuello já tem futuro, se assim desejar. Falta, agora, descobrir o do presidente Jair Bolsonaro, assim que ele aparecer.

Marina Andrade

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Trump sai, Bolsonaro continua

Nos EUA, um país a reconstruir; no Brasil, a possibilidade de não haver mais país

Em “De Volta para o Futuro” (1985), Michael J. Fox, vindo daquele ano, vai ao passado pela primeira vez e se refere a Ronald Reagan como o presidente dos EUA. Christopher Lloyd, o cientista, não acredita: “Reagan, o ator? Presidente dos EUA??? E quem é o vice? Jerry Lewis???”. Em 1955, ano em que se passa a história, Reagan, já relegado a filmes B, não poderia ser o presidente nem na tela —papel reservado a atores sóbrios e amados, como Henry Fonda, Ralph Bellamy, Fredric March—, quanto mais na vida real. Pois, em 1980, a vida real elegeu Reagan. Pena que sem Jerry Lewis.

Claro que, diante de Donald Trump, Reagan ganhou estatura de estadista, digno sucessor de Washington, Lincoln e Franklin Roosevelt. Trump rebaixou o cargo a níveis que nem o genocida James Buchanan (1857-61), o imoral Richard Nixon (1969-74) e o mentiroso George W. Bush (2001-09) se atreveram. Fez isto somando e absorvendo as piores ignomínias desses três e acrescentando a última audácia que os EUA esperariam de seu presidente —um projeto de golpe e ditadura.

Trump sairá pelos fundos da Casa Branca em 48 horas, mas o mundo ainda não está a salvo. Até o último minuto ele continuará a fazer o mal —insuflando seu gado ao ódio, sonegando dados sobre a pandemia para seu sucessor e cogitando anistiar a si mesmo e à sua família pelos crimes que cometeram. Muitos americanos que o apoiaram descobrem agora que sua ideia de poder não visava a um fim, qualquer que fosse. Ele era o meio e o fim. A psiquiatria deve ter um nome para isso.

Com o fim de Trump, os americanos têm um país a reconstruir. Aqui chegamos à metade do mandato do subclone Jair Bolsonaro e o pior ainda está por vir.

Pendurado na brocha sem a escada de seu líder, só cabe a Bolsonaro recrudescer. Ele também se vê como um meio e um fim. Resta ver quem chegará primeiro a este fim —ele ou o Brasil.

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Assim rasteja a humanidade

apartheiddois

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Morre Tiomkim, o pioneiro do audiovisual no Paraná

Morreu neste domingo (17) em Curitiba, aos 68 anos, Osval Dias de Siqueira Filho, o Tiomkim, jornalista, videomaker, produtor de cinema, vídeo e fotografia.  Pioneiro do audivisual no Paraná, durante  24 anos ele atuou na ação cultural do Museu da Imagem e do Som (MIS-PR) – e há 25 anos produzia o programa radiofônico “Cinemaskope, A Maravilhosa Música do Cinema”, que ia ao ar todos os domingos às 22 horas na Rádio Educativa, e também produzia o site cinemaskope.com.

Pioneiro na área de video-arte no Paraná, produziu vários curtas, na categoria experimental, e participou de diversos festivais de video na década de 90. Foi premiado no Festival do Maranhão com os troféus Itaú, Especial do Juri e o internacional OCIC (Organização Católica Internacional) em parceria com o cineasta Estevan Silvera. Também ganhou o grande prêmio do Salão Curitiba Arte V (1989) e foi até Praga na antiga Tchecoslováquia onde registrou o fim do Comunismo. Cinéfilo de carteirinha, ele tinha uma coleção de mais de mil discos de vinil com trilhas sonoras do cinema, além de mais de 500 DVDs.

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Anvisa aprova uso emergencial de impeachment

Numa segunda reunião no final da tarde, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária aprovou por unanimidade o uso emergencial de impeachment. “Os estudos mostram que o impeachment pode ser tão eficaz quanto a vacina. Dados apresentados são muito claros ao mostrar que o impeachment pode provocar a imediata produção de anticorpos contra o negacionismo, a inércia e a mitomania.”, explicou o infectologista Dagoberto Alberto Felisberto.

A doutora Irene Serena Eparema explicou como funcionará o impeachment no sistema imunológico brasileiro. “O que está acontecendo hoje é o seguinte: os sinais de doença são enviados. Mas os linfócitos colocam a culpa nos glóbulos brancos. O pâncreas diz assim. ‘Eu não posso fazer nada’. O fígado, já irritado, diz que o estômago o impede de trabalhar. Aí o coração afirma: ‘E daí? Não sou o intestino’. Todo o corpo cria inimigos imaginários para justificar sua inércia. Enquanto isso, a doença se alastra. O impeachment pode fazer com que o sistema imunológico brasileiro comece, enfim, a trabalhar”.

Para o início da campanha, foi criado o mascote Rodrigotinha.

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#ForaBozo!

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Ticiana Vasconcelos Silva

Tenho um caso de amor com a minha inteligência. Vá lá que não sou grandes coisas na vida, o que é uma burrice, mas e daí? Isso não determina minha qualidade de pensamento. Muito pelo contrário. Tudo o que passei, passo e passarei uso para pensar. Também não me considero inteligente a ponto de me considerar inteligente. Certas coisas penso bem. Outras, nem tanto. E muitas me vencem. Minha mente permanece ávida por pensamentos. Todos os dias meus pensamentos vêm em forma de questionamento.

Pra que questionar a vida, né? Coisa desnecessária, irão dizer. Mas, para mim, comum. Penso sempre, por exemplo: que ciclo infernal de acordar e dormir sem fim. Pode parecer besteira, mas já pararam pra pensar? Ou será que eu penso coisas bizarras? Não me parece estranho achar que dormir e acordar todos os dias seja uma obrigação a mais. Talvez seja. Mas eu não me conformo com este tal de ciclo. Por isso, durmo e não quero acordar. Tenho que dormir e não quero ir pra cama. Uma criança birrenta, praticamente. Acho que sou mesmo uma criança descobrindo o mundo a cada hora através do pensamento. Investigo e questiono.

Gostaria de apenas aceitar. Mas não é da minha índole. Ir além é ter sempre um cisco no olho para destravar. Elucidar o olhar. Através do pensamento. E quando não houver mais questionamento, questionar o vazio. Sempre há o que pensar. E olhar para a mente é descobrir o sono. Hora de dormir.

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O que fazer com as sandices que líderes populistas publicam nas redes sociais?

Mesmo longe de uma boa solução, banimento é preferível à censura estatal pura e simples

Uma das características da onda de extrema direita que varre o mundo é a instrumentalização da liberdade de expressão para propagar notícias falsas e discursos virulentos. A reação de muitos dos democratas tem sido a de defender uma relativização das proteções à liberdade de expressão. Será que é esse mesmo o caminho?

Vale lembrar que, durante ao menos dois séculos, versões razoavelmente fortes da liberdade de expressão desempenharam papel central na consolidação de algumas de nossas melhores instituições, como a democracia e a ciência. Não penso que devamos correr o risco de retrocesso nessas áreas só porque experimentamos um quinquênio de dissabores.

O que fazer, então, com as sandices que líderes populistas como Donald Trump e Jair Bolsonaro publicam em suas redes sociais? A pior solução seria atribuir a algum órgão de governo o poder de decidir o que vai ou não ser publicado. Felizmente, não há muitos defendendo esse caminho.

Uma saída mais popular tem sido pressionar as big techs para que exerçam seu poder de edição e banam ou ao menos reduzam a visibilidade dos discursos mais radicais/violentos. Isso é decerto preferível à censura estatal pura e simples, mas fica ainda longe de uma boa solução.

A reclamação de trumpistas e bolsonaristas de que a exclusão das redes também configura censura procede só em parte. Se o cidadão deve ter a liberdade de dizer o que quer, empresas devem ter a de escolher o que vão ou não publicar. Melhor ainda se elas forem muitas, ideologicamente diversas e se pautarem por regras racionais, claras e previamente anunciadas.

A principal dificuldade desse arranjo é que ele concentra poder demais nas mãos dos hoje poucos atores empresariais. Mas não deixa de ser um avanço trocar o quase impossível paradoxo da tolerância (precisamos tolerar os intolerantes?) pelo problema mais tratável de como lidar com monopólios.

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Carta branca para a morte

Governo sabota, à vista de todos, tudo o que pode combater a pandemia

O ser imoral que atende por Jair Bolsonaro forçou o jornalismo a deseducar e endurecer a linguagem em referências ao governo e, ainda mais incisiva, sobre o intitulado mas não presidente de fato.

Com os assassinatos por asfixia cometidos pela incúria e o deboche no Amazonas; mais de 200 mil mortos no país entregue à pandemia e à sabotagem, e a patifaria contra a vacinação vital, mesmo a grosseria realista é insuficiente.

Nem a liberação dos chamados palavrões, feita pela Folha e O Globo há algum tempo, soluciona o impasse. Muitos as consideramos aquém do jornalismo e os demais ficariam expostos a inconvenientes legais.

A asfixia é reconhecida como uma das mais penosas formas de morte, acréscimo ao nosso horror com as mortes em campos de concentração nazistas, nas câmaras de gás para condenações passadas nos Estados Unidos, como nas perversões criminosas. Hoje, é aqui que essa morte terrível ocorre, vitimando doentes que tiveram a infelicidade preliminar de nascer no Brasil.

Que considerações valeria tentar sobre esse fato? Seus responsáveis são conhecidos. Um presidente ilegítimo pela própria natureza e pela contribuição para a morte alheia. Um general patético e coautor, sobre os quais apenas vale dizer aqui, ainda, da lástima de que não terão o merecido: o julgamento por um sucedâneo do Tribunal de Nuremberg.

Bebês, 60 bebês, parturientes, operados, cancerosos, infartados, vítimas da pandemia, às centenas, milhares, desesperados pelo ar que os envolve e no entanto lhes falta. Todos diante da morte terrível, não pelo que os internou, mas de asfixia —por quê?

Guardião de 62 pedidos de impeachment de Bolsonaro, Rodrigo Maia enfim dá sua explicação para o não encaminhamento da questão ao exame das comissões específicas: “O processo do impeachment é o resultado da organização da sociedade. Como se organizou contra os presidentes Collor e Dilma”.

Não houve uma pressão “que transbordasse para dentro do parlamento. Não foi avaliar ou deixar de avaliar impeachment, e sim compreender que a pandemia é a prioridade para todos nós”.

O fácil e esperado. Mas os casos de Collor e Dilma nasceram no Congresso, não na sociedade. Foi a mobilização, lá, de parlamentares que gerou e fez transbordar para a sociedade a exigência do impeachment de Collor.

A “pedalada” contábil do governo Dilma nunca passou pela cabeça de ninguém, na sociedade e no Congresso. Foi o pretexto criado já a meio da conspiração lá urdida por Aécio Neves e Eduardo Cunha, símbolos da pior corrupção, a que corrói a democracia pela política. A mídia (sic) levou para a sociedade o golpismo transbordante no Congresso.

Se a prioridade fosse a pandemia, o governo não continuaria entregue aos que a negam e como governo sabotam, à vista de todo o país, tudo o que possa combatê-la. Para isso recorrendo, sem receio, a ações e omissões criminosas. Uma sucessão delas, incessante até hoje.

​Se nas mais de 200 mil mortes houvesse apenas uma induzida pelas pregações e sabotagens de Bolsonaro, já seria bastante para ser considerado criminoso homicida. Mas são muitos os interesses financeiros e políticos a protegê-lo. Na verdade, mais que isso, porque é carta branca que lhe tem sido assegurada, sobre 212 milhões de brasileiros, como sobre o presente e o futuro do país.​

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O general Pazuello e a minha vó

No Brasil, a autoridade sanitária repete as crenças (erradas) de minha avó

Custou-me acreditar no que li. Pessoas estão morrendo asfixiadas em Manaus por falta de oxigênio nos hospitais, e o ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, atribuiu o colapso do sistema de saúde manauara ao aumento da umidade e ao fato de médicos locais não prescreverem “tratamento precoce”.

O general dificilmente poderia estar mais errado. Ecoando as recomendações de minha avó, ele acha que o problema é as pessoas saírem na chuva e não tomarem cloroquina. No mundo real, é o clima seco, e não o úmido, que favorece as infecções respiratórias, e, apesar de a cloroquina já ter sido esquadrinhada por cientistas, nenhum estudo de qualidade demonstrou que ela tenha efeito importante contra a Covid-19.

A explicação científica mais geral para o caos em Manaus está na curva exponencial. Epidemias se caracterizam justamente por concentrar muitos casos num intervalo curto de tempo. Sem medidas de contenção, um vírus pode entrar em propagação exponencial e saturar rapidamente até os mais robustos sistemas de saúde.

O problema de Manaus, que não é diferente do de várias outras cidades, é que, apesar dos alertas dos especialistas, as pessoas relaxaram nas medidas de segurança. Cansaram das privações sociais, aposentaram máscaras, viajaram e celebraram a chegada do novo ano em populosas confraternizações. Em Manaus, ainda se aglomeraram para protestar contra as regras de distanciamento que o governo queria impor.

Redes de saúde pequenas como a do Amazonas e de Rondônia são as primeiras a colapsar, mas não há motivo para que grandes centros não enfrentem dificuldades parecidas, especialmente se estivermos lidando com mutações que geraram cepas virais mais infecciosas, como parece plausível.

Atentas a essa terrível possibilidade, autoridades sanitárias europeias estão endurecendo as restrições. No Brasil, a autoridade sanitária repete as crenças (erradas) de minha avó.

Publicado em Demétrio Magnolli - Folha de São Paulo | Deixar um comentário
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Índia faz Bolsonaro sentir gosto amargo do nacionalismo que tanto defende

A dificuldade do governo de Jair Bolsonaro em obter as vacinas fabricadas na Índia não é aduaneira e nem científica. Tampouco se trata de um problema de transporte e nem de um risco de calote. Brasília, no fundo, esbarra em outro obstáculo: o nacionalismo do governo indiano.

Neste fim de semana, Nova Déli inicia sua vacinação em massa, prevendo 600 milhões de doses para os próximos meses.

O governo ultranacionalista indiano tem sido pressionado por sua base mais radical a demonstrar agora que esse caráter do discurso do primeiro-ministro Narendra Modi vai além das palavras. Diplomatas na Índia confirmaram à coluna que um dos aspectos para fechar essa equação das entregas ao Brasil era a questão política.

Foi justamente esse nacionalismo que aproximou os dois líderes. No ano passado, Modi convidou Bolsonaro para a celebração do dia nacional do país. O indiano é acusado de fazer uma campanha nacionalista, de atacar minorias e até de minar o caráter de diversidade do país. Seus laços com líderes da extrema-direita também têm sido alvo de polêmicas.

Jamil Schade

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O direito ao auxílio emergencial

No dia 30/12/20 o presidente Jair Bolsonaro anunciou o fim o auxílio emergencial que foi concedido em 2020 e chegou a 197 bilhões reais.  Por qual razão sempre quando se fala em direitos sociais e coletivos o governo afirma não ter recursos?

Vamos a alguns exemplos recentes. A dívida acumulada do governo FHC para os bancos brasileiros, em 20 anos, é de 28 bilhões.

O governo Temer perdoou R$ 30 bilhões aos bancos, nos seus primeiros 90 dias de governo e, ainda, R$ 47,4 bilhões de dívidas de grandes empresas.  Desde 2008 o governo federal perdoou R$ 176 bilhões das dívidas dos times de futebol.

Em resumo, há recursos para pagar o Auxílio Emergencial até o fim da pandemia e, após, manter o pagamento de uma renda mínima para os cidadãos que estão desempregados e na linha da miséria.

A pandemia continua se agravando e não há nenhum motivo para cessar o pagamento do auxílio. A fome é uma forma de violência e de tortura às populações desassistidas.

Acontece que os super ricos e os bancos nunca pagaram a conta dos seus lucros astronômicos neste país que tem as maiores juros do mundo e grandes abismos sociais.

A Constituição expressa que são objetivos fundamentais do Brasil promover o bem estar de todos, erradicar a pobreza e a marginalização.

A Lei 10.835/2004 prevê o direito à renda básica de cidadania, para garantir a alimentação, educação e saúde. Neste sentido, caso não ocorra a continuidade do pagamento do auxílio emergencial estar-se-á descumprindo a lei de renda mínima e a Constituição.

O direito à vida e à sobrevivência é maior que as intenções políticas, vítima de uma administração caótica que deixa o povo desamparado em plena pandemia e sem perspectiva de emprego. Continue lendo

Publicado em Claudio Henrique de Castro | Deixar um comentário
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