Ó tempos, ó modos

Sempre tem um filhote de Apeles na curva, de tocaia, à espera de quem escreve. Hoje o Insulto faz o sapateiro de Apeles, o cara chamado para conferir a chinela e passa a dissertar sobre o quadro. O quadro hoje está em duas notícias do Uol, a notícia e o advérbio. Melhor, as notícias e o advérbio, ele repetido. Uma notícia nos conta que “jovem de 16 anos morre de enfarto dentro da própria casa”. Outra, que “o sertanejo Leonardo não comparece ao casamento da própria filha”.

As notícias, sem o ‘própria’, são informativas o suficiente. Para que serve o ‘própria’? Como nada acrescenta ou esclarece, o ‘própria’ só pode ser um vagido emocional do editor ou redator – possivelmente enroscado nas leituras do ensino médio. Alguém dirá, um outro filhote de Apeles, que o ‘própria’ está ali para situar os eventos: a própria casa, a própria filha. Ou seja, um efeito demonstrativo. Não. O demonstrativo seria outro, nunca a própria casa, a própria filha.

Se o garoto morreu em casa, evidente que foi na casa dele; se o papelão de Leonardo em não vir ao casamento da filha, só poderia ser da filha dele. O próprio dispensavelmente subentendido nos dois casos. Este pode parecer um exercício ocioso. E é, porque quem escreve assim continua escrevendo assim. Hoje, sábado ocioso, o Insulto permite-se higiene mental depois de assistir o vídeo de Joice Hasselmann com ameaças o Supremo. Coisa pesada, de dar cassação na ditadura militar.

A deputada postou o comentário na sexta, ontem, depois de passar a manhã no Planalto com Jair, Flávio e Eduardo Bolsonaro. Jogada ensaiada, os quatro criticaram o julgamento do Supremo, da quinta anterior. Joice foi além: travestiu-se de Gilmar Mendes, a quem chamou de ‘jaguara’, sinônimo imperfeito do ‘gentalha’, grosseria do ministro com os meninos da Lava Jato. o Insulto prefere insultar os modos do advérbio. Porque Joice insulta os modos de comportamento.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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