Que lástima, hermanos!

Hiperinflação de mais de 143%, pobreza de 40%, desemprego incontrolável, dívida externa impagável, falta de reservas, desesperança, tristeza, raiva… Tudo isso e muito mais fizeram o desalentado eleitor argentino eleger presidente da vizinha república, no domingo, o trapalhão Javier Milei. Quem é Milei? Ao que se sabe, um deputado ultradireitista, ultraliberal ou “anarcocapitalista”, como gosta de identificar-se. Na verdade, é um farsante, bravateiro, boquirroto, cujas promessas de campanha foram acabar com as aposentadorias e pensões, extinguir o Banco Central, privatizar as empresas públicas, retirar restrições cambiais, dolarizar definitivamente a economia e cortar as relações com o Vaticano do Papa argentino, “um comunista”...

No Brasil, vimos coisa parecida há pouco tempo. É um filme de terror, que assusta a nação, agride a democracia, afeta a liberdade dos cidadãos e, sobretudo, expande a intriga, o ódio e a violência entre as pessoas.

Aqui, foi estrelado por um tal capitão Messias, que suportamos no poder, com grande amargura, dor e irritação, quatro anos. Não por falta de aviso. Pouco tempo antes das eleições brasileiras, várias foram as advertências. Eu mesmo escrevi neste espaço:

“O cap. Jair Messias Bolsonaro é vazio, oco, não tem programa de governo, não sabe administrar, não é capaz de juntar as ideias. O que fará na presidência da República? Esteve durante sete legislaturas na Câmara de Deputados e o que fez pelo Brasil? Rigorosamente, nada. Apenas meteu-se em confusão, agrediu as mulheres e os homossexuais, defendeu a tortura, pregou o armamento da população, o fuzilamento de pessoas, o fechamento do Congresso e outras asneiras de igual quilate, como fazer a apologia da ditadura militar de 1964.”

(Errei ao considera-lo vazio. Na verdade, era recheado de ideias golpistas, com o propósito de manter-se no poder, sob a tutela das Forças Armadas.)

Prossegui:

“Se o eleitor está pretendendo votar no capitão como forma de protesto, não direi que é um idiota porque tenho amigos queridos que pretendem e não são idiotas, mas digo que são mal informados, irresponsáveis, inconsequentes e odeiam o Brasil. Talvez sejam daqueles tantos que desejam sair correndo do país e são capazes de deixar aqui, de raiva, uma bomba prestes a explodir na cara dos brasileiros que ficaram. Patriotas não serão. Tampouco democratas.”

Pois o eleitor brasileiro elegeu o capitão Messias e deu no que deu.

O eleitor argentino, desgraçadamente, preferiu eleger Milei. O que acontecerá com a figura na Casa Rosada? Só Deus sabe. Mas a gente desconfia, por experiência própria.

Entre nós, depois de um mandato de tragédias, farsas, incompetência, conspiração contra da democracia, insanidade e tramoias, o bota-fora do delinquente foi marcado por um quebra-quebra sem precedentes, com bandidos adestrados e remunerados invadindo, depredando e saqueando o patrimônio público nos palácios do Planalto, Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal. Um retrato de seu mestre e inspirador – aquele ignóbil cagão que fugiu antes de terminar o mandato para a terra de seu ídolo topete alaranjado, deixando plantada no Brasil a semente do ódio, da desordem, da calhordice e da indecência. Agora, o ex-capitão está às voltas com mais de uma dúzia de processos em tramitação nos tribunais, incluindo o STF. Para o bem de todos e felicidade geral da Nação, já deveria ter sido recolhido aos costumes.

Javier Milei garante que toma conselhos políticos com o espírito de seu falecido cachorro Conan através de médium que faz a conexão entre eles. Há, porém, quem diga que Milei não completará o seu mandato.

O analista Leonardo Sakamoto, do UOL, acha que Javier Milei pode ser derrubado pelos próprios eleitores, se cumprir o que prometeu: “um monte de coisas de alto risco para a qualidade de vida dos mais pobres que dependem do poder público”. E cita, como exemplos, o corte de subsídios ao transporte público, a substituição da educação pública gratuita pela distribuição de vouchers e o desprezo às políticas públicas do bem-estar social.

Opinião semelhante tem o professor Carlos Vidigal, as UnB, que menciona a falta de apoio parlamentar do novo governo e a ferrenha atuação dos sindicatos peronistas, que lhe farão oposição e poderão desencadear greves e manifestações públicas de expressão, com o enfraquecimento precoce do governo. “Daí tenho dúvidas quanto à conclusão do mandato” – arremata o mestre.

A Argentina, aliás, tem histórico de mudanças abruptas de governos e quedas de governantes ao longo do tempo. Javier Milei poderá vir a ser apenas mais um deles.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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