Reconquistemos a esperança, eleitor

Vamos lá às urnas, colega eleitor. Com dor e desesperança, vamos lá. É assim que se honra a democracia. Ou, pelo menos, tenta-se honrar. As opções não são boas? Mas uma é um pouco menos pior do que a outra. E cabe-nos optar por ela. E seja o que Deus quiser!

Aprendi com Rubem Alves, o meu filósofo favorito, que votos e eleições dão a impressão de democracia. Porque votos e eleições são (ou deveriam ser) meios para que os ideais do povo se realizem. Só que, como também ensina Rubem em sua imperecível obra, é aí que se encontra a delicadeza e a fragilidade da democracia: “Para que ela se realize, é preciso que o povo saiba pensar”.

E pensar, lamentavelmente, não tem sido uma das atividades mais profícuas do povo brasileiro. Povo que não pensa, não sabe identificar os ratos, que se infiltram na vida pública através do voto. Como se vê atualmente.

No domingo, ao comparecer à urna, o eleitor deve lembrar de “A Revolução dos Bichos”, de George Orwell, aquela deliciosa fábula de uma fazenda onde a bicharada resolve fazer uma revolução democrática contra o fazendeiro opressor. No final, enquanto o cavalo, que fazia o trabalho pesado, vai parar numa fábrica de mortadela, os porcos, na condição de líderes dos bichos, fazem uma aliança com o fazendeiro e acabam juntos no poder. E juntos riem e fumam charutos.

Tanta coisa precisa ser ainda aprendida pelo eleitor brasileiro. Coisas elementares. Como, por exemplo, fugir dos alardeados salvadores da pátria, que alardeiam mentirosamente a sua própria decência; dos falsos inauguradores de obras, que a cada “obra” inaugurada, inauguram-se a si próprios; daqueles que se dizem representantes de Deus e seus porta-vozes na terra. Esses muito pouco se importam com o que pensa e quer o povo.

Adélia Prado, outra professora de vida, confessa que já perdeu a inocência para os partidos e os políticos: “Quero que me governe um homem bom e justo, que cuide para que, chegando a noite, todo mundo vá dormir casado com tanto trabalho que tinha por fazer e foi feito”.

Pessoalmente, concordo com Adélia e com Rubem que não dá vontade de votar diante dos candidatos que aí estão. Como já passei dos setenta, nem precisaria ir à sessão eleitoral. Mas, no próximo domingo, irei. Com dificuldade, arrastarei os pesados grilhões atados aos meus tornozelos e, num derradeiro esforço, caminharei à urna. É uma obrigação e um dever cívico, aos quais não nos podemos furtar. Em nome da democracia e, sobretudo, em nome do Brasil, do qual até a bandeira já nos foi roubada.

Quero a minha bandeira de volta, quero o meu país de volta, com a saúde, a segurança, a educação, a cultura, os rios e florestas, os povo indígenas e os excluídos de volta, sem violência, sem ódio, sem intrigas. Quero a vida, a dignidade e a esperança de volta.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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