Faleceu no domingo (03), em Curitiba, aos 93 anos, Ubiratan Lustosa. O curitibano Ubiratan foi um dos maiores nomes dos anos de ouro do rádio paranaense. Locutor, produtor, apresentador e diretor, atuou nas rádios Marumby, Clube Paranaense e Paraná Educativa. Era formado em Direito pela UFPR, poeta e escritor. Em um dos seus livros, conta a história do rádio paranaense. Mas, acima de tudo, Bira, como o chamavam os mais próximos, tinha amigos.
Aliás, amigos era o que não faltava para Ubiratan Lustosa. Um deles foi o desembargador do Tribunal Regional do Trabalho Ney José de Freitas. Hoje, professor e consultor jurídico, Ney também é poeta e cultua a arte e a cultura. Encontrou entre os seus guardados um escrito dos idos de 2013, em que homenageia o Bira. Ei-lo:
“Bira.
“Almocei com Ubiratan Lustosa, no restaurante do Braz Hotel, centro, boca maldita, em Curitiba. A comida simples, desengordurada, possui um traço caseiro que me agrada. O ambiente tem um certo ar nostálgico de uma Curitiba que não existe mais. Durante anos almocei, sempre na mesma mesa, com meu saudoso amigo Scorsin, inclusive dias antes da sua morte. Encontrar Bira, chamo-o assim desde que o conheci, num jantar na casa de Jan Szapstoski é sempre uma alegria. Acompanho a sua carreira desde os tempo da rádio Clube Paranaense, a famosa B2 da época. Essa emissora embalou a minha vida de menino e de jovem. Era o tempo dos programas de auditório. A B2 reproduzia em Curitiba o perfil da Radio Nacional do Rio de Janeiro. Assisti a alguns programas: Cineac Rádio, comandado por Souza Moreno, e Expresso das Quintas, apresentado por Mário Vendramel, tudo nos estúdios da Barão do Rio Branco, na parte superior da Lojas Santos e Irmãos (a rádio pertenceu a esse grupo, onde se destacava a figura de Epaminondas Santos).
“A B2 destacava-se, também, na parte musical, recebendo cantores e cantoras de todo o Brasil. Diante da elevada despesa, o acompanhamento era feito por músicos locais. Esse fato proporcionou o surgimento de competentes músicos da terra. Concentro a minha homenagem, a todos, na figura do Regional do Janguito, cavaquinho, Talico no violão de seis, Edmundo no pandeiro e o notável Arlindo sete cordas, que eu tive a honra de conhecer e, inclusive, tocar (mal, é verdade) juntos, por diversas vezes.
“Esse cenário não estaria completo sem Ubiratan Lustosa, o nosso Bira. Talento multifacetado. Locutor, ator, escritor, o seu nome confunde-se com o rádio no Estado do Paraná. Até a poucos dias, ainda, apresentava o programa Revivendo, na Rádio Educativa do Paraná, recheado de saudade, com músicas antigas, mas de excelente qualidade, preenchendo o coração de pessoas de uma faixa de idade mais madura. Mesmo afastado do microfone, Bira está ativo. Escreve poesias, crônicas, história do radio e mantém um sitio dedicado a manter viva a memória desse extraordinário meio de comunicação de massa, com textos, fotos antigas e notícias desse mundo fascinante onde consumiu grande parte da sua fértil existência.
“É lamentável o estado atual do rádio em Curitiba. A frequência de ondas médias, a minha AM, acabou. Tornou-se reduto de evangélicos e católicos, com uma programação insuportável. Destilam, a meu ver, uma noção equivocada de Deus, transformando a prática religiosa numa verdadeira mercância. Duas ou três, no máximo, proporcionam uma linha de programas locais com qualidade aceitável. De modo que é saudável, em todos os sentidos, conversar com Bira e recordar uma forma de rádio que se perdeu nas brumas do tempo. Mas se atente: enquanto viver pessoas como Ubiratan Lustosa, haverá uma trincheira em defesa do rádio como poderoso instrumento de comunicação, como exercício de democracia (todos podem ouvir rádio, independentemente da condição social), como forma sadia de entretenimento”.