O óculos de Beto

O GOVERNADOR Beto Richa não fez favor nenhum ao Paraná. Também não fez desfavor com o mar de lama que deixou esparramado na Praça da Salete. Não fez desfavor porque não houve nada de novo na corrupção em seu governo. A corrupção do governo Richa pode ser definida em latim: non nove sed nova – não foi nova, apenas feita de outro modo. E nem se sabe com certeza se o governador participou dela, por ação, omissão ou comissão. O ministério público apreendeu bens dele e da mulher, mais dele que da mulher. Isso ainda vai dar pano para manga.

Alguns bens apreendidos chamam a atenção e reclamam reflexão: os objetos de uso pessoal do governador, os quais seus advogados pedem a restituição. Entre eles óculos, cintos e relógios – e canetas, sim, senhores, Beto Richa com canetas é algo que surpreende. Primeiro, registre-se que o requerimento dos advogados quebra um paradigma na língua portuguesa: a relação contém dúzia e meia de “um óculos”. Um esnobe qualquer da gramática diria que Beto tem visão monocular, um só olho útil, tanto que não usa “um par” de, mas “um óculos”.

Bobagem. Devemos festejar advogados que falam assim, no foro ou fora do foro. Se Beto foi corrupto, é assunto da justiça. A grande questão está nos ítens pessoais apreendidos: só produtos de grife. Não grifes quaisquer; grifes esportivas, que remetem a automóveis de grife. Muitos relógios, muitos óculos, muitos cintos. O governador parece rico de filme americano, o bonitão com gavetas e mais gavetas de vistosos relógios, cintos e óculos no ‘clôse’ – usados em combinação estrita com a roupa, o clima e sobretudo o humor.

O MP deixou de apreender perfumes, loções de barba, cremes hidratantes, desodorantes de marcas famosas. Podia não caber, por serem bens consumíveis. Mas daria ênfase à futilidade do governador. E chego ao quod erat demonstrandum, o CQD da matemática. A apreensão de bens pessoais no closet de Beto Richa foi inútil, não revela corrupção. A menos que ele não tenha recibo de compra daquilo tudo, o que leva à conclusão de que foram presentes. Pois pelas marcas superam o limite de valor dos presentes que podem ser aceitos pelos funcionários do Estado

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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