A máscara e a mobilidade do rosto humano

É espantosa a riqueza de possibilidades de um ser humano para modificar suas feições com simples movimentos dos músculos do rosto. Nenhum outro animal consegue aproximar-se do incrível número de mudanças que um rosto produz em uma hora. Apesar disso, existem pessoas que assumem, por conta própria, um comportamento que bloqueia grande parte das possibilidades. Chegam à fria imobilidade de uma pocker face — feições impenetráveis de um jogador de pôquer durante toda a rodada. Mas a regra é a que aponta pessoas com poucas modificações no decorrer de um dado período. Às vezes, pela vida inteira. Não diria que são pessoas com poucas emoções ou vivências armazenadas. Mas não deixa de ser estranho que não utilizem esses preciosos recursos de comunicação.

Atores exploram tais recursos. Alguns, porém, exageram e criam estereótipos. São forçados a usar em todos os filmes as mesmas caretas e acabam por saturar a platéia. Outros criam ar de impassividade permanente. Em qualquer cena, mostram a mesma cara.

Certa vez li um livro sobre montagem de filmes. Estava-se nos primórdios do cinema e as experiências eram as mais variadas. Um famoso diretor de filmes pegou a foto do rosto de um ator com feições neutras e colocou, logo depois dela, um prato cheio de comida. Ao mostrá-las em sequência para algumas pessoas, todas disseram que a cara do ator era de fome. Repetiu a experiência colocando um bebê logo depois da foto do ator. As pessoas não hesitaram em dizer que ele estava muito emocionado. Daí o diretor concluiu que “cinema é montagem”.

Vemos isso hoje nas transmissões esportivas na televisão. Conforme a montagem das cenas, os comentaristas se esbaldam vendo no rosto dos técnicos as mais diversas expressões. Basta colocar a cara do técnico depois de um gol do adversário e o comentarista acha que ele está triste, nervoso, raivoso. Se você mudar a cena para um deslize do árbitro com a mesma cara do técnico, ele se torna desgostoso, indiferente, preocupado.

Aí, surgiu a máscara para que os movimentos do rosto se imobilizassem. Numa festa, para todos parecerem alegres, basta que usem máscaras de palhaço. O curandeiro da tribo sabia que a máscara impunha respeito e podia ser usada repetidamente para causar efeito. Descobri que, quando acham uma pessoa parecida com diversas outras, é porque ela combina no rosto variadas feições, com movimentos da face. As pessoas confundem expressão com traços fisionômicos.

*Rui Werneck de Capistrano é mais do que chique. É Chic-chic.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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