Sacaneados e escaneados

Rogério Distéfano – O Insulto Diário

A REPÚBLICA DE CURITIBA não é a de Platão, onde mandavam os sábios. A República de Curitiba está mais para a de Sólon, o severo administrador ateniense. Quando associamos a República de Curitiba a Sólon só um nome nos vem à memória: Sérgio Moro. Basta, não tem pra ninguém. Roberto Requião não sai da grossura e da bravata, Rafael Greca, do motejo e da facécia, Beto Richa, ora, Beto Richa é ele e os anos-luz de parentes e amigos aprontões. Sérgio Moro é substantivo e adjetivo, não fala pelos cotovelos, não diz gracinhas nem acha que tem senso de humor como os outros. Aliás, não tem humor. Tivesse, usaria aqueles ternos, aquelas camisas, aquelas gravatas?

Fala-se tanto em candidatos a presidente da república, cada qual pior que os quais piores. No Paraná os candidatos brigam no mesmo balaio, todos a se arranhar pelo afago de Beto Richa. Nosso miserê é tamanho que nem tem candidato da oposição. Ou candidata, Gleisi, por que não? Ela também arranha e lanha, gata no cio político. Tenho um sonho e um candidato a governador, Sérgio Moro. Ele não mostraria os dentes para morder ou para sorrir. Melhor: sorri quando está com a mulher ou esnobando o colega Marcelo Bretas. Ah, Moro governador.  Nosso juiz da Lava Jato iria pôr ordem na assembleia, no tribunal de contas, até no judiciário. No executivo, passaria o rodo no Iguaçu.

Não vou adiante na plataforma de campanha. Fico no detalhe, o sistema prisional. Vocês nem imaginam o que sejam as cadeias e as prisões do Paraná. Eu sei, trabalhei com isso. Visita íntima de preso, as mulheres e maridos de quem está preso têm escarafunchadas as intimidades, invadidas pelos dedos de quem confere contrabando de celular, faca, droga. No pedacinho da prisão que coube aos presos de Sérgio Moro é diferente, muito diferente desse mundo de pobretões criminosos. Ali, do lado norte, sol generoso e longe dos presos pés de chinelo, estão dos presos de roupão com monograma: os corruptos da Lava Jato, gente que lê dez linhas por dia e desconta vinte dias da pena.

Até no Brasil as coisas tem limite, muito poucas, é verdade. O limite estourou quando fizeram revista íntima na mulher de Sérgio Cabral, aquilo de se agachar sobre o espelho para conferir se não vinha coisa ilegal. Até na prisão que abrigou petista uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa: perereca da mulher do traficante é uma coisa, perereca da mulher do corrupto – deve ser -, outra, bem diferente. Se corrupto é diferente de ladrão comum, por que não a perereca de mulher do corrupto?  Corrupto é como a cachorra de Rogério Magri, que era levada ao veterinário em carro oficial: “também é ser humano”, como justificou o ministro do Trabalho de Fernando Collor.

As intimidades das visitas aos corruptos não serão esgaravatadas pelas mãos ímpias dos agentes penitenciários, sem luvas sem grife. Nada de se agachar no espelho, como exigiram de Adriana Ancelmo, primeira dama, sócia, cúmplice e corré do maior corrupto do Brasil, Sérgio Cabral. Agora visitas de corruptos presos serão escaneadas; fomos sacaneados por eles, agora escaneados por nós. Benefício que nunca tiveram, não têm e dificilmente virão a ter os ladrões de galinha, assaltantes e traficantes de miudezas, gente de intimidades pouco asseadas, sem perfume francês. Dizem que haverá escâner para os presos não corruptos. Imaginem o superfaturamento, as propinas.

O escâner teria racionalidade se os visitantes dos corruptos trouxessem montanhas de propina nas anfractuosidades. É tanto que não cabe nas pererecas, estão nas offshores. É de onde virá a burla ao escâner. Lá dentro, dentro da frente ou de trás, até do nariz, debaixo da língua, até no buraco da orelha, cabe o extrato de movimento da conta de propinas. A escâner, como diria o economista da propina, é uma externalidade da Lava Jato, um efeito não pretendido na causa primeira. Quase suficiente porque, como sempre, só ajuda a zelite, a zelite da propina. O juiz Moro não inventou o escâner,  inventou a prisão dos corruptos. Como Pilatos, que não inventou, mas não sai do Credo.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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