Sessão da meia-noite no Bacacheri

eutanásia

Mesmo carregado de emoções, ‘A Festa da Despedida’ é hilariante

Tema cada vez mais presente na sociedade, a eutanásia, com suas múltiplas implicações, vem sendo discutida pelo cinema. “A Festa de Despedida”, da dupla de roteiristas e diretores israelenses Sharon Maymon e Tal Granit, aborda o assunto pelas lentes do absurdo e do humor negro.

Engenheiro aposentado, Yehezkel (Ze’ev Ravach) vive numa casa de repouso em Jerusalém e sofre com a situação de Max (Shmuel Wolf), seu amigo, doente terminal que deseja morrer em paz. Instado por Yana (Aliza Rozen), a mulher de Max, Yehezkel decide construir uma máquina de eutanásia para pôr fim ao drama do amigo.

Ajudado por idosos que vivem na mesma casa de repouso, Yehezkel logo monta a engenhoca, que libera um produto letal mediante um comando dado pelo próprio doente, configurando um suicídio assistido, prática considerada crime na imensa maioria dos países.

Quando os rumores sobre a existência da máquina começam a circular, outros idosos se interessam por ela, dando lugar a várias peripécias, e o grupo passa a viver um dilema moral.

Essa conjuntura delicada é encarada com humor e autoderrisão, sem nunca resvalar no gratuito. As situações tragicômicas e os diálogos cheios de irreverência são costurados com respeitosa sensibilidade, sem cair na farsa nem no sentimentalismo, conduzindo os personagens e o próprio espectador a uma reflexão sobre suas relações com o sofrimento, a velhice e a morte.

Tais assuntos ainda são tabus e, por isso mesmo, costumam ser tratados com a condescendência do politicamente correto ou são alvo de pudores e interdições –muitas delas relacionadas com a religião, que o filme destaca muito bem ao ambientar as ações numa sociedade em que a religião tem grande peso como a israelense.

A narrativa apresenta de maneira verossímil uma realidade complexa, sobre a qual lança um olhar humanista. Ajudar o doente a morrer, a pedido deste, torna o grupo de idosos uma gangue de criminosos ou uma confraria de amigos corajosos e sinceros?

As divergências e debates entre os amigos também proporcionam vários momentos engraçados. E até a hora “h”, mesmo estando sempre carregada de emoção, às vezes assume contornos hilariantes, como quando a falta de energia elétrica faz com que a paciente com câncer acabe mudando de ideia.

O roteiro de Maymon e Granit é um dos pontos fortes do filme, mesmo que algumas situações não funcionem muito bem, como a cena em que os idosos cantam um réquiem dentro do carro.

Outro destaque são os atores –muito populares em Israel– que encontraram o tom justo, despertando imediata empatia no espectador.

A FESTA DE DESPEDIDA (Mita Tova) DIREÇÃO Sharon Maymon e Tal Granit|ELENCO Ze’ev Revach, Levana Finkelstein, Aliza Rosen, Shmuel Wolf|PRODUÇÃO Alemanha, Israel, 2014, 14 anos

Alexandre Agabiti Fernandes – Folha de São Paulo

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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