Imagina-te, Clódia, encontrei uma mulher inimaginável, belíssima. Ela é de Caicó. Jamais pensei que uma caicoense pudesse ter tais atributos. É tudo tão longe, não é? E a gente nem sabe direito onde é Caicó. E se existe. Pois existe e muito! A mulher é inteira existente. Existe em maravilha da cabeça aos pés.
Não te preocupes, mas balancei um bocado. É alta, loira, letrada! Conhece literatura de cabo a rabo. O marido, o professor Gutemberg, viajou anteontem para um lugarzinho perto daqui chamado Muriaé. Não deu outra. Já sabes. Mas a mulher tem tamanhas qualidades que fiquei tímido, lasso, brocha e despeitado. E ontem, odiento, mandei-lhe o primeiro poema aí de cima, Pois imagina-te, hoje me respondeu com o aí de baixo. Estou mal, prostrado. Manda-me algumas palavrinhas; Caicó, meu Deus! Vou comprar hoje mesmo um mapa desse Brasil bandalho. Que surpresas! Que país! Que grelos insolentes e cultivados tão de repente! Eu fedo, Clodinha? Manda-me carícias e um fio do teu pentelho. Ela se chama Líria.
(Contos D’Escárnio. Textos Grotescos, de Hilda Hilst)
Sobre Solda
Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido
não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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