Tortura na sala de parto

É preciso entender como médicos se tornam monstros.

Um dos momentos mais sublimes na vida de uma mulher é ao dar à luz. Trazer uma criança ao mundo envolve muito amor e felicidade, mas também tensão, sensação de vulnerabilidade e preocupações. Por tudo isso, o nascimento de um filho deve ser cercado de cuidados e atenção. Mas o que se vê nos vídeos que mostram o parto da filha da influenciadora digital Shantal Verdelho equivale a uma sessão de tortura, comandada pelo obstetra Renato Kalil.

Ele xinga e humilha a jovem durante o trabalho de parto. Shantal é submetida à manobra de Kristeller, uma fortíssima pressão na barriga, técnica que não é mais recomendada pela OMS e pelo Ministério da Saúde há décadas por causa dos riscos para a mãe e o bebê. A cena é aflitiva. Kalil se irrita porque Shantal recusa outros procedimentos que, em tese, facilitariam o parto.

Entrevista recente da jovem ao Fantástico acrescentou detalhes ainda mais estarrecedores sobre o comportamento antiético do médico. A revelação levou outras mulheres a romper o muro de silêncio e medo e a denunciar Kalil por violência obstétrica e também sexual. O episódio mais antigo remonta a 1991.

Kalil não está sozinho entre aqueles que se aproveitam do exercício da medicina para abusar de mulheres. Veja-se o exemplo de Roger Abdelmassih.

Em outra escala, e por diferentes motivações, a pandemia da Covid também revelou profissionais de conduta criminosa. Os que empurraram cloroquina para seus pacientes, os que consideram que “óbito também é alta” e o ministro cardiologista, Marcelo Queiroga, que sabota vacinas para crianças.

É claro que os casos mencionados não respondem pelo conjunto dos médicos brasileiros. Sem dúvida a maioria é gente séria e comprometida com a saúde de seus pacientes. Mas são histórias perturbadoras, que devem levar a uma profunda reflexão sobre a formação, a prática médica no Brasil e o corporativismo.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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