‘Um lugar para voltar’

Zeila Ribas Vianna é uma escritora. E escritora de mão-cheia, como se dizia antigamente e como eu já disse aqui algum tempo atrás. Conheci-a através de “Sempre… o mesmo vento”. Era puro Erico Veríssimo, com sotaque paranaense. Como cenário, os Campos Gerais do Paraná. Nesse cenário do século XIX, dominado pelo vento, sempre o mesmo vento, Zeila narra a saga de sua família, nascida da união dos Teixeira de Azevedo com os Gonçalves Guimarães. E ao contá-la, conta a história do Paraná, de pioneiros, de tropeiros e sertanistas que fizeram o caminho caminhando e semearam a civilização paranaense com suor, sangue e idealismo. Por decorrência, conta um pouco da história de todos nós.

Encantei-me com a leitura e com o estilo leve, solto e envolvente de Zeila Ribas Vianna, recomendei a leitura de seu livro como obrigatória em sala de aula e incentivei-a a continuar escrevendo.

Em janeiro, recebi uma mensagem da autora. Dizia-me que, seguindo o meu conselho, continuou escrevendo e estava lançando um novo romance. Levou seis anos pesquisando, observando e, sobretudo, ouvindo histórias e lembrando das antigas que ouviu na infância. Não é uma nova obra biográfica, mas, ainda assim, tem muito de todos nós, da história e formação do Paraná. E, sobretudo, a força das mulheres, uma das características marcantes da literatura de Zeila.

Ela adverte que “Um lugar para voltar” é uma obra de ficção, os personagens são fictícios, porém grande parte dos fatos realmente aconteceram, assim como as narrativas históricas, abrangendo a cidade de Areal de Prata, que “pode ser qualquer pequena cidade dos campos meridionais do Brasil”. Com um acréscimo cativante: a história é toda contada pelos próprios personagens, “mulheres e homens ligados por laços de amor, sangue e amizade”, “fazendo com que o leitor sinta-se mais próximo deles, conheça seus pensamentos e sentimentos, participe de suas experiências”.

Tudo começa com o imigrante italiano Fredo de Santini, que, ainda muito jovem, desembarcou no Brasil, escalado pela família para encontrar a riqueza nas Américas. Do desembarque no Rio de Janeiro, onde tinha um lugar de trabalho reservado na Fábrica de Vidros e Cristais, de São Cristóvão, até a busca de novos horizontes no sul do país, foram dez anos, nos quais ele juntou algum dinheiro e aprendeu a língua portuguesa. Também sofreu com o calor carioca e a agitação da Cidade Maravilhosa. Então, recebeu a ajuda providencial de um colega da fábrica, que lhe falou de sua terra, um local com campos, matas e um rio com muitas praias de areia, que fica prateada quando bate o sol e por isso é chamada de Areal de Prata.

Aí, o sonho de Fredo de Santini mudou de rumo e a saga ganhou corpo, envolvendo Felícia Cardoso – que logo viria a ser também de Santini –, filha do fazendeiro Emílio Cardoso, que perdera parte de sua fortuna, mas não perdera a arrogância. Deles, vieram o casal Olímpio e Marica, os Cardoso, a imigrante russa Annya, o casal Pedro e Nina, os de Santini originais da Itália, o filho de Fredo e Felícia, Alfredo, amigo de Vicente Gouveia, filho Afonso e de Carmem, neto de Isabel e irmão de Cecília, com quem formaria família, a partir de Abelardo, Bernardo e Clara. Clara terá importância vital no desenrolar do romance, que começou com ela menina, enterrando os pés descalços na terra quente e arenosa para levar à vovó Feli um punhado de coquinhos de butiá. E com ela chegará ao fim, ao retornar, cheia de gratidão, à praça principal de Areal de Prata, depois de haver circulado entre a nobreza parisiense/marroquina, ao lado de Philippe d’Ambois. Nesse período, vários personagens se foram, outros chegaram. Clara tornou-se avó torta dos gêmeos Antoine e Blanche, de François e, por último, de Claire, nome dado em sua homenagem, filhos de Jean-Luc, fruto do primeiro casamento de Philippe.

Quando escreveu “Sempre… o mesmo vento”, Zeila Ribas Vianna morava na tranquilidade de Guaratuba. Agora, não sei se vive em Curitiba ou no Rio de Janeiro. O que sei é que continua uma craque na escrita. Hábil, competente e eficiente. O que escreve tem conteúdo e faz bem ao leitor. Felizmente, avisa que já iniciou as pesquisas para o próximo livro. Ficamos à espera.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
Esta entrada foi publicada em Célio Heitor Guimarães e marcada com a tag , , . Adicione o link permanente aos seus favoritos.
Compartilhe Facebook Twitter

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.