O “Monstro do Maracanã” e o “Pantera Negra” – VIII parte

Exatamente no horário marcado, Guttmann estava no local, cercado de toda a imprensa esportiva portuguesa e vários correspondentes de toda a Europa. Falou que, depois que esvaziasse as gavetas e os armários, daria uma declaração. Tarefa cumprida, dirigiu-se aos jornalistas e disparou: “Sem mim, nem em cem anos, o Benfica será campeão europeu”. Dito o que disse, voltou para a casa e no outro dia embarcou para Viena. Logo estaria em novos empregos, nos grandes clubes da Europa, mas, não repetiu o sucesso que teve no Benfica. Morreu rico em Viena onde foi enterrado.

Os jornais portugueses, no dia seguinte, apresentavam todos a mesma manchete: “A maldição de Béla Guttmann”, que pelo jeito vai durar mesmo cem anos. O Benfica, desde o lançamento da maldição, nunca mais voltou a conquistar qualquer copa europeia. O “mister” Jorge de Jesus falhou em duas finais da Liga Europa (Série B da Champions League). Na Copa dos Campeões, o Benfica chegou à final em 1962-1963 e foi derrotado pelo Milan por 2 x 1. Em 64-65, decidiu contra a Internazionale perdendo por 1 x 0. Em 67-68, foi a vez de ser derrotado pelo Manchester United por 4 x 1. Em 1987-88, caiu nos pênaltis, depois de um empate em zero a zero, para o PSV Eindhoven (onde jogava Romário). Em 89-90, sucumbiu para o Milan, em Viena, por 1×0. Depois, nunca mais chegou numa final da Champions.

A “maldição” de Béla Guttmann é até os dias de hoje o pesadelo dos benfiquistas. Na última vez que chegaram a uma final da Copa dos Campeões da Europa, em Viena, conforme dito no parágrafo anterior, o Benfica escolheu como chefe da delegação Eusébio da Silva Ferreira, que viajou com uma missão secreta para a obtenção da tão sonhada Copa. Chegando em Viena, a delegação foi para o hotel dormir. Eusébio foi o primeiro a acordar e cedo, muito cedo, para fugir da imprensa, pegou o primeiro táxi na frente do hotel e mandou o motorista deixá-lo no Cemitério Judaico de Viena. Alguns jornalistas já estavam na frente do hotel e pegaram outros táxis e dispararam a célebre frase dos filmes policiais norte-americanos: “Siga aquele carro”. Chegaram todos juntos na frente do cemitério. Um grande grupo se reuniu na porta que ainda estava fechada. No momento de abrir os portões, os seguranças foram peremptórios: “O único ‘goy’ que entra é Herr Eusébio” e fecharam os portões novamente. Levaram-no até o túmulo de Béla Guttmann e Eusébio ficou quase duas horas ajoelhado orando e pedindo que Guttmann retirasse a maldição. Guttmann, apesar de gostar muito de Eusébio, não foi sensibilizado. Em 2014, o Benfica, para “quebrar” a maldição, inaugurou no Estádio da Luz uma estátua de bronze de Béla Guttmann com dois metros da altura. As esperanças dos benfiquistas ainda continuam de pé. Na última Champions sub-20, o Benfica conquistou a Taça. Pode ser que, finalmente, Guttmann tenha se sensibilizado.

Com a estupenda atuação de Eusébio na grande final, os italianos Juventus, Internazionale e Milan passaram a oferecer bilhões de liras pelo seu passe. O assunto dominava os jornais e Salazar ficou preocupado. Mandou chamar ao Palácio toda a diretoria do Benfica e foi peremptório: “Enquanto eu for o primeiro-ministro, o ‘senhor’ Eusébio da Silva Ferreira não sai de Portugal”. Os dirigentes do Benfica obedeceram o ditador.

Na manhã seguinte, a grande conquista do Benfica sobre o Real Madrid, o diretor de marketing da King C. Gillette Inc. em Londres, como sempre fazia, abriu os principais jornais da Inglaterra para verificar se os anúncios haviam sido publicados de acordo com o contratado. Depois do almoço, chegavam os jornais dos principais países da Europa e ele renovava a verificação. Todos os periódicos que lhe chegaram às mãos naquele dia, estampavam na capa, em maior ou menor tamanho, a foto de um mulato escuro chamado Eusébio. Muito embora não entendesse nada de futebol, pois como norte-americano era fã do beisebol, o enorme sorriso de Eusébio, em todas as fotos, lhe chamou a atenção. Era exatamente o que estava procurando fazia tempo, um jovem, sorridente, bonito, agradável, de grande apelo popular. Além de tudo, era mulato escuro e a Gillette se preparava para aportar na África. Convocou um funcionário chamado Manuel Joaquim e quis saber mais de Eusébio.

Manuel Joaquim era benfiquista, apesar de radicado em Londres há vários anos. O diretor gostou das respostas do funcionário português e lhe ordenou: “Vá à agência de turismo mais próxima, compre duas passagens só de ida para Lisboa e reserve dois apartamentos no melhor hotel da cidade. Embarcamos os dois, se for possível, ainda hoje. Passe em casa e faça as malas, eu estou indo para a minha fazer o mesmo”.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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