Uma lição do velho cão

Parece mentira, mas neste ano completei 13 anos de Zé Beto. Em “O Estado do Paraná”, foram outros 13. Quer dizer, caminho nessa estrada, subindo e descendo ladeiras e contornando curvas, há 26 anos. É um tempão, convenhamos. Quando do comentário impresso, julgava-me porta-voz dos avós sem coluna; hoje, entrado nos oitentinhas, no máximo posso ser considerado porta-voz dos velhinhos sem blog. Aos jovens, antes que eles abandonem a leitura desta linhas ou comecem a fazer chacota, lembro que se nós, seus pais, avós ou bisavós, não tivéssemos envelhecido, eles não seriam jovens nem estariam aqui.

Por isso, prezado leitor, se você, tenha a idade que tiver, é daqueles que pensam que cachorro velho perde o faro e se torna inútil, permita-me dizer-lhe que nem sempre isso acontece. Às vezes, a velhice só traz mais sabedoria. Como no caso daquele cachorro velho, que embarcou com a dona em um safari na África e cujo caso me foi enviado por um bom amigo há algum tempo.

Enquanto a madame se deliciava com as girafas e gazelas, o velho cão caçava borboletas. Distraído, de repente, ele se deu conta de que tinha se perdido.

Vagando a esmo, atrás do caminho de volta, o velho cão avistou um jovem leopardo, que vinha em sua direção com intenções nada amistosas. Pensou rápido, porque velho, ao contrário do que se supõe, pensa rápido:

– Huuummmm… Estou enrascado.

Olhou ao redor e viu um monte de ossos espalhados pelo chão, próximo a ele. Então, em vez de dar mostras de pavor, achegou-se ao osso mais próximo e passou a roê-lo, dando as costas ao leopardo, como se não o tivesse visto.

Quando o felino estava prestes a dar o bote, o velho cão exclamou bem alto:

– Esse leopardo estava uma delícia!!! Será que há outros por aí?

Ouvindo isso, o jovem leopardo sentiu um arrepio na espinha e suspendeu o ataque. De mansinho, esgueirou-se em direção às árvores, pensando:

– Caramba! Essa foi por pouco. Aquele cachorro quase me pega!…

Um macaco, pendurado numa árvore ali perto, viu a cena e, safado como ele só, imaginou como fazer um bom uso do que assistira. Em troca de proteção para si, informaria ao predador que o vira-lata não comera leopardo algum…

E, assim, foi rápido atrás do leopardo. Mas o velho cão, que a tudo assistia, logo deduziu que ali tinha coisa…

O macaco alcançou o leopardo e contou-lhe o ocorrido, fazendo um acordo com o felino. O jovem leopardo ficou furioso por ter sido feito de bobo.

– Macaco, suba nas minhas costas para você ver o que vou fazer com aquele cachorro abusado!

Agora, o velho cão vê um leopardo furioso, com um macaco nas costas, vindo em sua direção. Pensa:

– O que eu posso fazer?!

Mas, em vez de correr, pois sabia que as suas pernas envelhecidas não o levariam muito longe, o velho cão sentou-se, dando as costas para os agressores, como se ainda não os tivesse visto. Quando sentiu que eles já estavam bem próximos, falou alto o necessário para ser ouvido:

– Cadê o f.d.p. do macaco? Estou aqui morrendo de fome! Ele disse que iria trazer outro leopardo para mim, e não chega nunca!…

Moral da história: não faça pouco de um cachorro velho. Idade e inteligência sobrepõem-se à juventude e à intriga. Sabedoria só chega com a idade e com a experiência.

P.S. – Este texto é uma homenagem aos colegas idosos, cujo dia internacional, instituído pela ONU, celebrou-se no domingo, 1º de outubro.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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