Pura defesa da dignidade humana

Dostoiévski é realmente, para mim, o maior autor de todos os tempos. Antes de começar a ler Gente Pobre, primeiro romance do autor, leio o texto de orelha feito por Boris Schnaiderman. Ali, ele diz: “Na época [o romance é de 1846, acrescento], estava repercutindo na Rússia o ‘ensaio fisiológico’ francês, mas Dostoiévski lhe acrescenta algo tipicamente russo: um toque maior de carinho e uma adesão mais categórica à causa dos mais humildes”.

Por essas coisas é que se percebe, ao menos para mim, o grau insuperável, em literatura, de humanidade de Dostoiévski. Está tudo nele. Tudo o que eu ao menos espero quando leio um livro. O que seria isso? Bem, só lendo com máxima sensibilidade se perceberá esse todo extremamente humano. Dostoiévski, é melhor lê-lo do que tentar explicar. Jovem, aos 24 anos, escreve Gente Pobre, e é uma revolução do gênero epistolar, típico do século XVIII. Dostoiévski tira a epístola do mero campo da vivência psicológica e introduz a consciência da injustiça social. O “homem sem importância”,  surgido com força em Gogol, ganha profundidade com Dostoiévski, que procura mostrar esse homem qual um ser pleno, com capacidade de refletir, de sentir e agir de modo bastante profundo apesar da pobreza e da humildade de classe social. Dostoiévski é a mais pura defesa da dignidade humana.  Deixo aqui dois trechinhos, que refletem todo o calor humano, esse quentinho (rsrs), do Dosta:

“…aceitou minha afeição por ele, minhas palavras afáveis, minha atenção, e correspondia a tudo com a mesma atenção, de modo igualmente amigável e afável, como um amigo sincero, como um verdadeiro irmão. Sentia-me tão bem e com o coração tão aquecido!”.

“Ah, foi um tempo triste e feliz — tudo junto, ainda agora me sinto alegre e triste ao recordá-lo. As recordações, sejam alegres ou amargas, são sempre um suplício; pelo menos para mim é assim, mas também esse suplício é doce. E quando o coração fica oprimido, dolorido, atormentado e triste, então a recordação o refresca e vivifica, como gotas de orvalho, numa tarde úmida que, depois de um dia quente, refrescam e revivificam a florzinha murcha, crestada pelo calor do dia.”

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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