Retratos 3×4 de Tancredo

Em 24 de agosto de 1954, Palácio do Catete, meia noite. O ministro da Guerra Zenóbio da Costa e o marechal Mascarenhas de Moraes chegam e comunicam a Vargas que a deposição é inevitável. Aviões da Aeronáutica fazem rasantes sobre o Catete. Getúlio manda chamar todos os ministros. Tancredo Neves estava no palácio desde cedo e quando adentra a sala de reuniões recebe uma caneta-tinteiro. “É um presente”, diz Vargas.

As duas da manhã, todos os ministros estão no local. Os marechais dizem que a Marinha também se revoltou. Os ministros ficam discutindo duas soluções: renúncia ou pedido de licença.

Tancredo, irritado, pede a palavra: “Covardes! Covardes! Se aparecerem soldados para depor o presidente, a solução é resistir. Pegaremos em armas, com a exceção dos covardes!”

Getúlio corta Tancredo e diz: “Já que os senhores não decidem, vou decidir. Pela manhã, terão minha decisão!”. Reunião encerrada. Às 8:35h, ecoa pelo Palácio do Catete o tiro dado por Vargas contra o próprio peito.

(Lira Neto. Getúlio. volume 3. São Paulo: Companhia das Letras, 2014, resumi)

Em 2 de abril de 1964, enquanto o Avro da FAB ainda estava no ar – levara mais de cinco horas para aterrissar em Porto Alegre, vindo de Brasília, 178 congressistas (26 senadores e 152 deputados) reuniram-se na Câmara dos Deputados. Reaberta a sessão, o presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, ao microfone: “Comunico ao Congresso Nacional que o senhor João Goulart deixou o Governo da República”.

Vaias e aplausos interrompem o discurso. Acalmados os ânimos, Auro continua: “Assim sendo, declaro vaga a presidência da República e declaro presidente da República o presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzili”.

Tancredo corre ao microfone e dispara: “Canalha! Canalha! Filho da puta!”

Auro declara encerrada a sessão, não sem antes mandar desligar o microfone de Tancredo Neves.

(Monteiro, Karla. Samuel Wainer: o homem que estava lá. São Paulo: Companhia das Letras, 2020, resumi).

Tancredo nunca usou a caneta-tinteiro presenteada por Vargas que, desconfia-se, foi com a que assinou a “Carta Testamento”. Tancredo de Almeida Neves dizia à Dona Risoleta que usaria a caneta no dia de sua posse como presidente da República Federativa do Brasil.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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